domingo, 21 de abril de 2013

Intervalo


Ainda que timidamente, ao longo dos últimos anos foram sendo lançados filmes cuja temática girava em torno do envelhecimento. Lembro-me que em um deles, cujo nome em inglês (Late Bloomers) poderia ser um “despertar tardio”, traduzido aqui por “Amor sem fim”, a bela Isabella Rosselini, em crise com um marido (William Hurt) que se recusava a aceitar o fato de estar envelhecendo, matricula-se em uma academia e em  uma tentativa de testar sua “visibilidade” ensaia uma entrada na lanchonete logo após notar que todos os homens ali presentes haviam virado a cabeça para olhar uma jovem que passara. Mal sucedida, apesar de ter desabotoado alguns dos botões de sua blusa, ela se senta desolada, certa de ter se tornado “invisível”. Se a grande maioria dos filmes preferiu abordar o tema pela via da comédia romântica, alguns sublinhando as mudanças na vida sexual, caso dos hilários “Alguém tem que ceder” e “Simplesmente Complicado”, o diretor Michael Haneke (Amor) levou o Oscar de melhor filme estrangeiro deste ano com um difícil, duro e melancólico filme que aborda de forma crua a “decadência” física de seus protagonistas e cônjuges, ambos próximos dos 80 anos. Por ocasião de seu lançamento, muitos que o assistiam aconselhavam seus/suas colegas mais velho(a)s a não irem com muita sede ao pote (evitarem ver o filme), tal o impacto de sua realidade. Nem seria preciso repetir o argumento de que o envelhecimento na atualidade vai conquistando sim uma visibilidade, mas muito mais por ser uma nova (e ainda desconhecida) realidade. A faixa dos 70 aos 100 anos ganhou uma população que antes era escassa ou praticamente inexistia, o que tem exigido esforços de todos os lados (famílias, governos, ciências) em busca de politicas publicas e novas pesquisas nas áreas da saúde, etc., na tentativa de ajustar/inventar soluções que lhes ofereçam algum bem estar. Por outro lado cria-se uma expectativa de vida difícil de ser prevista, apostando aqui que alguns possam desejar fazer essas previsões. É muito mais comum a recusa a se imaginar velhos, pois as limitações que a velhice impõe quase nunca são agradáveis de serem pensadas, além de tornar muito próxima a ideia da tão temida morte. Mas há os que enfrentam essa dolorosa reflexão e tentam minimamente antecipa-la. Como estarei vivendo aos 80? Poderei andar normalmente? Minha memória estará intacta, estarei lúcida/o? Terei companhia, vou querer conversar, contar sobre minha vida? Vou morar em minha própria casa dependendo de cuidadores ou filhos ou vou para uma casa de repouso? Como passarei meus dias? Poderei me sentir feliz? Sem dúvida esta ultima questão resume de certa forma as inquietações sobre o envelhecimento. Uma amiga próxima me contava que seus pais, cujas idades já ultrapassaram os 80 anos, estavam vivendo uma “boa” velhice. Para ela, o adjetivo “bom” só poderia ser empregado se ainda houvesse “paixões” possíveis. Seu pai, por exemplo, adorava cumprir uma rotina diária em que lia os jornais e depois se ocupava em montar um cardápio que lhe apetecesse e para o qual deveria sair em busca dos ingredientes. As noites eram reservadas para jogar tranca  com amigos do condomínio. Após sofrer um tombo, porém, teve que se confinar em casa e passou a ficar muito entristecido. Muito angustiada e impotente diante daquela tristeza, minha amiga constatava perplexa essa rápida e inesperada mudança. De uma hora para outra seu pai havia perdido a vontade de viver. Sensível, sua cardiologista propôs que contratasse um motorista/cuidador por algumas horas para que pudesse sair e dar continuidade a parte de sua rotina, o que fez com que ele aos poucos recuperasse sua “vida”. O problema é que as paixões precisam ser orquestradas pelas almas. Ou pela do próprio protagonista ou a de alguém que possa interpreta-las.

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Já ouviu falar?


Quando em setembro de 2012 participei do FDC Experience a convite de uma de suas organizadoras estava bastante curiosa para assistir o  convidado da rodada final de conversas, Bernardo Paz, o polêmico idealizador de Inhotim, museu de arte contemporânea de Brumadinho, pequena cidade da região metropolitana de Belo Horizonte. O FDC Experience é uma proposta da Fundação Dom Cabral (também mineira) - que figura entre as 10 melhores escolas de negócios do mundo-  e foi pensado para ser um evento anual que reunisse gestores espalhados pelo Brasil, dispostos a ouvir e debater novos rumos e cenários de modelos organizacionais junto a pensadores de áreas diversas como economia, história, tecnologia da informação, jornalismo, psicanalise, arte. Mas Bernardo Paz não se enquadra em modelos e tampouco se submete a padrões para comparações. Ele é um intuitivo, como ele mesmo costuma se definir. Quando conta a história de Inhotim não a separa de seu destino inquieto e atormentado, sempre insatisfeito, sempre angustiado, sempre ansioso, sempre deprimido, pelo qual toma pílulas para dormir e outras para acordar. Também não se considera um conhecedor de artes, embora fale com paixão sobre seus jardins botânicos exuberantes da grife do amigo Burle Marx com espécies tropicais raras ou de cada um dos “pedaços” de sua fazenda, que foram sendo ocupados pela arte de artistas brasileiros e estrangeiros de renome e compõem hoje um dos mais importantes acervos de arte contemporânea. Seu depoimento comove, no entanto, porque é espontâneo e parece querer convocar a todos a seguir seus sonhos, mas realizar algo pela humanidade. Estas lembranças me ocorreram quando poucos dias atrás a mídia anunciou o lançamento no Brasil do livro “Governança Inteligente para o Século XXI: Uma Via Intermediária entre Ocidente e Oriente”. Escrito a duas mãos, um de seus autores (o outro é cientista político), o alemão-americano que se auto intitula  investidor e filantropo e cuja fortuna ocupa algum número no ranking da Forbes, desde 2001se desfez de seus bens materiais – casas e carros incluídos – para se dedicar às ideias que pudessem contribuir para mudar os rumos dos governos do mundo. Com olhos discriminadores para as políticas governamentais de países diversos (Ásia, Europa, USA, América Latina) e suas relações com a sociedade civil, o mercado financeiro e as inovações tecnológicas, ambos buscam alguns sinais que indiquem um ponto de equilíbrio possível entre esses eixos, levando em conta as diferenças culturais de cada região do globo. Ou seja, não buscam fórmulas prontas e únicas e sim “manipuladas” caso a caso e para isso constituem pequenos grupos de intelectuais interessados em compor “usinas de ideias”. Já na cidade de São Paulo um grupo de jovens resolveu ocupar (de 5 a 14 de abril/2013) o chamado "baixo centro"  - os bairros de Santa Cecília, Vila Buarque, Campos Elísios, Barra Funda e Luz - com atividades culturais. Por acreditarem ser a ocupação  da cidade um direito de cada cidadão e com vistas a convocar a população local a se integrar, o projeto que inclui entre outras coisas intervenções urbanas, debates, desfiles, música, shows,foi organizado de forma a captar recursos por um sistema colaborativo, uma espécie de financiamento coletivo. Para viabilizar as 530 atividades inscritas, foi calculado um valor “x” que precisaria ser alcançado até a noite de segunda feira  dia 1°de abril, via contribuições pelo site. Detalhe: o cálculo dos custos ficava disponível para consulta em uma planilha on-line e caso não se atingisse o tal valor, todas as contribuições retornariam aos seus “donos”. Bingo! Eles conseguiram. Enquanto eu escrevia este texto pensava que atos revolucionários independem de épocas ou de fórmulas prévias. Às vezes são apenas boas ideias.