A Folha de
São Paulo convidou dois de seus colaboradores para um debate sobre amor e
infidelidades na noite do dia 18 de junho: a antropóloga carioca Mirian Goldenberg,
que escreve no Caderno Equilíbrio e pesquisa há duas décadas o comportamento de
homens e mulheres em sua relação com temas como sexo, casamento, fidelidade, e
o cartunista Adão Iturrusgarai que entre outras pérolas criou a personagem
Aline, aquela que mantém há anos uma “boa” vida conjugal com dois namorados.
Enquanto Mirian tentava traduzir para a plateia os principais resultados de
tantos anos de interrogatórios sobre um assunto tão sério e polêmico, Adão se
encarregava de desconstruir a lógica estatística com seu humor. Frutífero, o
diálogo entre os dois rendeu um livro, “Tudo o que você não queria saber sobre
sexo” (Ed. Record). E pelas perguntas dos espectadores era possível mapear o
que insiste em escapar aos números. Sob olhares interrogantes homens e mulheres, atrás
de seus (novos?) lugares sociais, buscam orientações e dicas sobre o que e como
viver suas vidas amorosas. Existe uma fórmula para o amor? Neurocientistas e
químicos analisam a estrutura biológica em busca de pistas. Psicólogos e
antropólogos tentam criar teorias. Ainda temos horóscopos, cartomantes, mapas
astrais, toda sorte de superstições e simpatias, além de nosso casamenteiro
Santo Antônio, que no ultimo dia 13 deve ter recebido um bocado de orações. Como
encontrar o parceiro ideal? Existe um grau de atração necessário para se manter
um romance? A liberdade sexual alcançada pelas mulheres trouxe-lhes alguma conquista? O que mudou para elas? O que mudou (ou não)
para os homens? Quem trai mais? Há diferenças nos motivos de homens e mulheres
para traírem? Quem quer se casar, homens e/ou mulheres? As perguntas
tangenciavam o imbróglio maior, nossa vida amorosa, e como bem disse a
antropóloga, se há um consenso em torno do que queremos para ela é que possa
conter tanto a liberdade quanto a segurança, duas das maiores ânsias
contemporâneas. Todos querem desejar, amar, trabalhar, se divertir, fazer parte
integral da cultura e da sociedade, mas botam uma fé danada no amor, na espera de
que ele possa trazer paz, preencher o vazio, produzir um sentido para as suas
vidas. Sonhamos com uma vida amorosa e sexual
nos moldes do “foram felizes para sempre”, sem perturbações que questionem
nossos desejos ou a falta dele ou conflitos que revelem nossa incapacidade de
gerenciar sua complexidade. Se homens e mulheres buscam isso o que vem depois? É
aqui que Adão Iturrusgarai desperta gargalhadas ao expor as bizarrices do que em
geral não revelamos de nossas vidas íntimas, os bastidores da relação entre
amor e sexo. Isto talvez denuncie a impossibilidade de mapearmos sua
complexidade, principalmente quando incluímos a tal da fidelidade, cujas razões
confrontam e questionam as regras que
construímos. Ok, todos sonham em ter um parceiro ideal, sonham em amarrar o
bode (de suas vidas) em alguma árvore, e isto guarda um pouco do mito da
monogamia, este resquício poderoso de nossa infância: ter alguém que nos ame
para sempre, que nos ache especial, que não nos deixe cair no vazio ou na
desventura de nos sentirmos excluídos e sem valor. Mas o que acontece com a
estampa feliz do casal depois que eles passam pelo umbral da porta de seu lar
doce lar? Em geral não estamos muito
dispostos a saber sobre as decepções, os ressentimentos, as brigas, etc. Ler (e
rir) das tirinhas de Adão sobre relacionamentos pode ser uma alternativa.
domingo, 24 de junho de 2012
quinta-feira, 21 de junho de 2012
O amor “en-cena”
No sábado
do dia 8 de junho de 2012 o Estadão publicou uma entrevista do filósofo e
ex-ministro da educação da França, Luc Ferry, em que este dizia que vivemos a
era da revolução do amor. Não estaríamos mais dispostos a nos sacrificar em nome
de grandes ideias ou de utopias, mas possivelmente em nome de nossos filhos,
pais ou amigos, ou seja, daqueles que amamos. O casamento por amor, e não mais
por interesses, estaria no centro desta nova ordem social e teria disparado (neste
ultimo século) a desconstrução de muitos valores tradicionais. Nossa sociedade teria
se transformado em um conjunto de individualidades (homens e mulheres) que
buscam a emancipação desfrutando de uma liberdade jamais alcançada, e o
esperado seria que pudéssemos aceitar melhor o diferente, já que nosso objetivo
maior seria o de preparar o futuro daqueles que tanto amamos, nossos filhos, ou
melhor, as gerações futuras. Por isso, da condição humana pós-moderna seria
esperado valores morais como a solidariedade, a tolerância, a gentileza e a
amizade. Mas como evitar que estes valores degenerem para o egoísmo, a insensibilidade
e o desinteresse pelas misérias humana ou simplesmente pelo outro? Este é o
paradoxo sobre o qual versa o novo filme do polêmico diretor Roman Polanski em cartaz em São Paulo, “O Deus da
Carnificina”. Baseado na peça da dramaturga e atriz francesa Yasmina Reza (já
encenada na Broadway e em São Paulo) a ação se passa em um apartamento em Nova York e tem como disparador
a briga entre dois garotos em que um deles é ferido pelo outro, fato que fará
com que os pais dos dois marquem um encontro para um pedido formal de
desculpas, sem a presença dos meninos. A princípio, a educação e a civilidade
imperam, com os pais do garoto agredido recebendo em sua casa os pais do
agressor, mas aos poucos a polidez dá lugar a uma artilharia verbal e a
cordialidade antes sob o controle do manual do politicamente correto, descamba
para uma exposição escancarada daquilo
que chamamos “vida privada”. Embora possa ser considerada uma comédia de
costumes, o filme consegue perturbar a todos os espectadores que aos poucos vão
sendo tomados por uma tensão desconfortável (vez por outra descarregada por
risos nervosos) que os leva a torcer para que os casais desistam daquela troca
de ofensas, deem por terminado o conflito e voltem para suas tocas. Paira uma
certa vergonha, este sentimento social que ajuda a viabilizar nossas relações
com os outros ao marcar um espaço de intimidade para cada um, e assim guardarmos
nossos sentimentos/desejos secretos que poderão ou não ser compartilhados
segundo nossas escolhas. Mas o desconforto também sugere que identificamos ali
a possibilidade disso acontecer com cada um de nós o que confirma que a construção
do espaço social de convivência esbarra no modo como nossas emoções organizam nossas
vidas interiores. Se o casamento por amor funda uma nova maneira de existir em
que o amor não só passa a regular a vida familiar e societária como se mantém
como uma promessa de felicidade para a vida de cada um, vivemos em um circuito
amoroso em que o culto ao amor que se recebe dos pais impõe a necessidade de
buscar indícios do amor no outro, aumentando a importância do amor como
confirmação do próprio valor. E funda uma lógica menos racional e mais
emocional para as motivações dos comportamentos humanos. Na sala de estar do apartamento em que praticamente
acontecem todas as cenas do filme, o café/bolo/ética/gentilezas vai aos poucos
cedendo espaço ao uísque/carências/mágoas/agressividade. Todos confessam seus
mais miseráveis sentimentos e acusam algum dos outros por suas faltas. Há ora
uma aliança entre os pares conjugais, ora entre os gêneros e as trocas de
farpas parecem esconder pedidos de reconhecimento de valor, de amor, de
superioridade moral/social/intelectual, de poder. Faltou um estranho, alguém de
fora, que adentrasse naquela sala e cochichasse aos ouvidos dos quatro como somos
limitados em nossas pretensões, pegasse de forma carinhosa as mãos do casal
visitante, levasse-os até a porta agradecendo sua disponibilidade, juntasse as mãos
do casal anfitrião, convidasse-os a irem dormir em sua cama de casal, apagasse
as luzes e deixasse enfim na tela do cinema, o “The End”.
quarta-feira, 20 de junho de 2012
Sentimento nacional
Londres é o tipo de cidade que costuma surpreender os desavisados e causar, em geral, uma espécie de “bom” estranhamento diante do antigo e do novo, da presença constante dos ícones da monarquia em contraste com a liberdade de estilos e a diversidade de etnias de seus cidadãos. Cosmopolita e controversa, tradicional e supermoderna pode-se em um mesmo dia imaginar-se voltando alguns séculos diante do ritual da troca da guarda no Palácio de Buckingham e ao zarpar para Piccadilly Circus, onde se concentram os teatros, cinemas, artistas de rua, ou para o leste com seus ateliês, galerias, lojas e diferentes tribos de jovens já avançar para a vanguarda dos tempos atuais. No domingo de 3 de junho último,canais de TV permitiram que o mundo todo celebrasse junto à família real, a festa dos sessenta anos de reinado da Rainha Elizabeth II e assistisse milhares de espectadores acenarem suas bandeirinhas e se amontoarem as margens do rio Tâmisa – com a chuva e o frio que caracterizam os céus londrinos- à espera do cortejo de mil barcos que acompanhou a embarcação real. Sessenta anos não é pouco e durante este período, a geração de nossos pais, a nossa e a de nossos filhos acostumou-se a “conviver” com esta senhora e seus familiares, ora sob o fascínio de sua pompa e circunstância ora com o espanto de sua humanidade. Entre baixas e altas pode-se dizer que a maioria do povo britânico aplaude e sente muito orgulho de sua família real, mesmo quando ela vai parar nas manchetes dos jornais e revela capítulos picantes de sua historia ou expõe seus gastos milionários. Assim como o chá e a pontualidade, a família real faz parte da identidade cultural inglesa. E isso não é pouco. É justamente este sentimento nacional que dá visibilidade a monarquia britânica, ao contrário de outras que passam quase despercebidas. Pode-se dizer que grande parte da força da “marca” desta realeza que acaba por devolver seus gastos aos cofres públicos e leva uma série de benefícios ao país, principalmente em forma de turismo, nasce deste sentimento nacional de orgulho e crença de seu povo em seu valor. Quanto a nós brasileiros, será que temos uma identidade nacional? A possibilidade que a mídia contemporânea abriu de um convívio mais próximo com outros povos, seus costumes, sua estética, nos permite apontar diferenças importantes para cada uma das culturas, que em geral são tanto a graça quanto a desgraça de cada país. Cá no Brasil, apesar de grande nação, de falarmos a mesma língua em toda a extensão territorial e convivermos com um baixo índice de conflitos étnicos ou religiosos, guardamos uma singela aura infantil no sentimento de pertencimento principalmente quando o foco é a responsabilização de cada cidadão sobre os rumos ou desacertos do país. Ao contrário de nossos vizinhos argentinos, p.e., preferimos deixar cair na “vala”, quaisquer desrazões ou mal ajambrados jeitos de resolver nossas questões e contradições, evitando o debate e por decorrência, os mal estares de seus acertos e todos os desafios implicados na defesa dos interesses de uma nação. Há os que se desanimam ao ver perpetuado um certo “jeitinho brasileiro” de dourar a pílula. Mas há sempre os que apostam que esta mesma eterna “juventude” do país pode guardar a potencia de medidas e soluções inovadoras. Há os que esperam e os que se implicam.
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