sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Ser pai, mãe, filho, filha...

A maioria de nós acredita ser a busca da felicidade um dos maiores valores de nossas vidas. E embora o que nos torne feliz ou a idéia de felicidade seja particular e se articule com o momento histórico em que vivemos, existem alguns ícones culturais que comungam de um certo consenso quanto a sua importância. A constituição de uma família é sem dúvida um destes valores sagrados. Por isso quase todos deitam seus olhares às famílias, julgam as condutas de seus membros, aprovam, desaprovam ou criticam como se tivessem certeza quanto aos lugares certos de cada coisa, tal como um jogo de sete erros em que basta assinalarmos na imagem o que está fora de lugar. A família como a conhecemos (pai, mãe e filhos) certamente carrega desde sempre esta idealização, assim como suas contradições. Sofremos muito com nossas culpas ao imaginar que nossas famílias em nada se parecem com esta imagem feliz (claramente idealizada) em que o pai tinha autoridade e sabia como educar seus filhos, os rituais eram seguidos à risca, a mãe se ocupava do bem estar de todos, os filhos cresciam “normais” e preparados para seguirem seus destinos. Ficamos entre esta versão nostálgica e queixosa ou buscamos de forma gratuitua o modelo oposto da família “moderninha”, com pais fraternos e inseguros, mães libertas e permissivas, filhos e filhas críticos e/ou desajustados. Por onde buscar o que é ser homem, o que é ser mulher, o que é ser pai, mãe, filhos? Questão complexa, já que vivemos em um mundo com novas regras. Piores? Melhores? Diferentes, com certeza. Não somos mais os mesmos pais, mães e filhos. Nem os mesmos homens e mulheres. Ficamos sem muitas referencias e nestas últimas 50 décadas tivemos que construir na “raça” novos modelos. Entre erros e acertos, sabemos hoje que não se nasce homem ou mulher e tornar-se um deles implica em um tumultuado percurso. Se o lugar social destinado às mulheres teve um deslocamento gigante, é claro que isto teve conseqüência para o lugar destinado aos homens. Se nós mulheres passamos a desejar, a amar, a ter uma profissão, a nos divertir, a fazer parte integral da cultura e da sociedade, era mais do que esperado que tais mudanças questionassem o mundo aparentemente arrumado dos homens, cujas novas gerações já começam a encarar a si próprios. Neste sentido não só as mulheres, mas também os homens se encontram em pleno estado de errância, em um mundo novo em que deveriam estar mais autorizadas as falhas e as inseguranças. Sem um chefe da família, os casamentos são parcerias, com pactos que cada dupla constrói para gerenciar seus direitos e deveres, assim como as separações não são mais evitadas quando estes pactos afundam e se perdem. E a decisão de ser pais? Questão difícil, envolta em mitos e crenças em torno de um modelo de mãe sagrada, cujo instinto maternal por si só já lhe concederia os requisitos necessários para exercer esta função de entrega amorosa aos filhos. Quem é ou foi mãe sabe bem que ter um filho é se afastar do mundinho conhecido, mais ainda daquele idealizado, com promessas de felicidade absoluta. Não só não habitamos o nirvana quando nos tonarmos mães, como muitas vezes nos descabelamos, sentimos raiva, choramos desesperadas, nos arrependemos, nos sentimos loucas. Assunto tabu, mantido em segredo, difícil de ser partilhado mesmo entre mulheres que se sentem envergonhadas e culpadas ao imaginar que estes sentimentos são provas de incompetência e de incapacidade de amar seu(s) filho(s). Se a maternidade é este túnel sem final à vista, no qual só se entra quando se quer muito, ou quando não se tem opção, a paternidade também não está mais descrita previamente. Longe do modelo autoritário, muitos pais começam a escrever novas páginas sobre suas difíceis experiências de paternidade. No mais que bem-vindo mundo compartilhado, muitos trocam fraldas e aprendem sem constrangimentos a difícil arte de cuidar de seus bebês. Para complicar, os pais e mães têm que conviver não só com suas próprias expectativas em relação ao futuro de seus filhos, mas com o acúmulo de atenções da cultura sobre a infância em geral, o que aumenta e muito seus sentimentos de incompetência e sua insegurança diante de suas frágeis ferramentas parentais. Sabemos apenas que nossos pimpolhos precisam de nossos cuidados e muitos de nós queremos fazer o melhor. Assim, sem muitos caminhos a seguir, tentando construir pontes mais resistentes, ser pai e mãe são hoje apenas destinos possíveis, erguidos com trabalho, encima de sucessos e fracassos reiterados. E podem ser melhores se deixarmos de lado a figura mítica da família idealizada,este paraíso perdido que insistimos em manter como referencia de uma feliz eficiência.

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