A morte de Gabriel Garcia
Marques, quinta feira, dia 17 de abril, me fez recordar uma parte de minha
história, ao relembrar o impacto que a leitura de “Cem anos de solidão” produziu
no meu pequeno percurso de leitora. Quando o li, já fazia alguns anos que ele
surgira no universo literário, fazendo barulho. Afinal, narrar a história
latino-americana com suas guerras e solidão a partir da árvore genealógica da
família Buendía e suas gerações,recorrendo
à fantasia para revelar a realidade, tudo isso sem perder o fio da meada, não é
tarefa para qualquer um. E se hoje esta saga é considerada uma das obras mais
importante da língua espanhola de todos os tempos (depois de Dom Quixote), a
lembrança de minha leitura não contempla tal grandeza. Jovem, ainda, fiquei
capturada pelo realismo mágico com que os personagens eram descritos, com a
liberdade um tanto crua com que suas histórias de amores e dores podiam ser
vividas e a maneira surpreendente com que suas experiências cotidianas eram
transformadas em algo fantástico, mágico, mas ainda assim verossímil. Ainda não tenho muito claro o papel que a
literatura teve na minha visão de mundo. Mas tenho a impressão, quase como se
fosse uma certeza, de que ela abriu horizontes e despertou-me para universos
desconhecidos e inimagináveis. Há quem reconhece seus desejos desde muito cedo
e nao só os nomeia, como os persegue. Nunca pertenci a este grupo, mas se há um
pensamento que permeou minha vida desde bem jovenzinha, é o de que o “mundo” (aquele
composto pelo acervo cultural humano) deveria ser muito maior do que aquele que
eu conhecia ou vislumbrava na cidade interiorana em que eu vivia. E eu
precisava conhecer o máximo que eu pudesse sobre ele, o que com gratidão posso
atribuir uma boa parte às minhas poucas leituras de grandes autores da
literatura. Gabriel Garcia Marques nasceu em uma cidadezinha da Colombia, tendo
vivido uma parte de sua infância sob os cuidados de seus avós, com quem ouviu
muitas das histórias fantásticas que depois utilizaria em seu universo
literário. Em um dos muitos textos que foram escritos após a notícia de sua
morte, um em especial, de seu conterrâneo, amigo e escritor Hugo Abad, narra
sua última visita feita em 2010 a Gabo- como era chamado pelos íntimos- segundo
ele já desmemoriado, mas ainda poético. Foi ali, na cidade de Cartagena, que
ele ouviu Mercedes, esposa de Gabo, contar que quando ali chegaram, a ideia era
comprar uma casa antiga no centro histórico para morarem. Mas Gabo nunca se
decidira sobre isso, com medo dos fantasmas. Fiquei a imaginar o escritor
Gabriel Garcia Marques, que já se despedira do mundo intelectual desde 2006
quando resolvera não mais escrever, a habitar a pátria que todos temos em
comum: nossa infância. Obrigada Gabo!
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