O sociólogo argentino Horácio González que fez seu
doutorado no Brasil nos anos 80 e agora dirige a Biblioteca Nacional da
Argentina se perguntava em entrevista concedida a Ilustríssima no ultimo
domingo porque um presidente como Getúlio Vargas, do qual se guarda até o
pijama com o buraco da bala que o matou, não se tornou no Brasil um ícone
popular da dimensão de Perón. Seriam os brasileiros menos apaixonados por
política do que os argentinos? Segundo ele os argentinos teriam uma relação
muito singular com as figuras de seu passado como Perón, Evita, Borges ou
Gardel, transformados em mitos e, portanto sempre vivos e presentes. Sem
conseguir formalizar um parecer definitivo sobre as diferenças entre as duas
culturas ponderou se a falta desta tradição aqui poderia ser favorável a uma
“felicidade” maior dos brasileiros, mas como um bom argentino sucumbiu à
importância dos polêmicos e constantes debates produzidos entre seus
conterrâneos que respiram e participam com suas entranhas da sua historia. Talvez
o panorama que se delineou no período pré-eleições para prefeito e vereadores da
maior e mais rica cidade do Brasil possa nos ajudar a pensar sobre este modo
mais “cool” de se comprometer com os rumos da politica do país, dos estados ou
das cidades. No dia seguinte às vitórias de Serra e Haddad como candidatos a
disputar o segundo turno destas eleições era possível ler vários textos -
alguns surpresos, outros orgulhosos, muitos tateando as causas da virada em
torno da candidatura Russomano, antes líder das pesquisas. O que teria
acontecido? O colunista da Folha de São Paulo Xico Sá chamava a atenção para o
facevoto. Segundo ele nas ultimas semanas as pessoas teriam aberto
escancaradamente seu voto no Facebook, postado suas convicções, discutido os
prós e contras uns e outros, compartilhado informações sobre a idoneidade de
alguns candidatos, as jogadas politicas, as ligações partidárias, as parcerias
duvidosas. Mas ao contrário do colunista, arrisco colocar o peso menos na rede
social – embora ela tenha sido um veiculo veloz não só de trocas, mas de
compartilhamentos e, portanto de uma abrangência inédita – e mais no fato mesmo
de que estes “brasileiros”, tal como nossos hermanos, teriam exposto suas
preferencias politicas de forma apaixonada, acendendo as luzes antes apagadas
pelo sentimento generalizado de descrença. Assim, a coragem de uns cutucava a
reticencia de outros. Lembrei-me de um debate entre empresários sobre certas
características especiais dos gestores brasileiros. Ao contrário de outras
culturas, nossos executivos teriam muito jogo de cintura para improvisar
situações que evitassem constrangimentos ou mal-estares e pareceriam mais a
vontade na manutenção a qualquer custo do clima de cordialidade e tolerância. Tudo
se passa como se ao excluir os conflitos, ao não se falar sobre as
discordâncias ou não se reclamar os direitos se instalaria um espaço menos
agressivo e mais tranquilo. Comportamentos reivindicativos ou falas mais
indignadas seriam comumente avaliados como ataques pessoais desnecessários. Nosso
estilo “cool” guardaria, portanto em sua origem, uma tentativa de evitar a
discórdia, o debate e as discussões tão ao estilo “caliente” de nossos
vizinhos. Mas ao preço de perdemos o engajamento e a responsabilidade que todos
precisam ter de concordar ou discordar dos valores, de muda-los se for o caso, de
se perguntar sobre qual tipo de sociedade deseja viver ou como acha que devam
ser as empresas ou os políticos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário