terça-feira, 18 de junho de 2013

Nós na foto


Dia desses uma amiga, após ser convocada por si mesma a passar uma informação que evitaria uma surpresa desagradável a uma colega, comentou ironicamente que sua atitude tinha como objetivo maior contribuir com a garantia de seu passe para o “paraíso”. Assim, em pequenas “prestações”, ela apostava na conquista de certo sossego enquanto vivesse, já que poderia contar com o conforto de acreditar que “Alguém” estaria pontuando seu bom comportamento. Corta. Um conhecido que participou recentemente de uma reunião em seu  condomínio ficou espantado quando num certo momento, em um efeito dominó, alguns moradores passaram a se alterar e ficar mais violentos ao reclamarem seus direitos ou queixarem-se dos incômodos do convívio coletivo. Suspirou aliviado, a seguir, diante da intervenção sensível do síndico que, ao perceber que tais moradores precisavam de uma atenção especial, soube se colocar como mediador dos conflitos, oferecendo-se para ajudar a resolver algumas pendengas, sem se esquecer de evocar aos reclamantes a parte que lhes cabia na política (sempre difícil, sem dúvida) da boa vizinhança. Quem sabe algo que tenha faltado na história trágica divulgada dias atrás, em que sem conseguirem resolver as crescentes desavenças que só aumentavam o ódio de parte a parte, um empresário de 62 anos de posse de seu 38, invadiu enlouquecido o apartamento de cima e matou a queima roupa o casal de moradores, poupando de sua ira apenas o filho de um ano e meio. Provavelmente sem poder suportar o que imaginava serem as consequências de seu ato, apontou a seguir o revolver para si e pôs, assim, um “fim” a todas as perturbações. Como sempre acontece em fatos tão inimagináveis à maioria - justamente pela maneira obscena e banal com que a vida humana é tratada – espalham-se indignações, mas principalmente medos e inseguranças já que qualquer um, de qualquer lugar, pode ser portador de um excesso incompreensível de violência e ódio. Mas quem sabe o “matador” não estivesse em seu estado normal, quem sabe ele estivesse passando por problemas graves, ou portador de algum transtorno psíquico? Não é o que revela sua esposa (e amigos) que atribui seu ato a um “surto de loucura” circunscrito àquela situação. Claro que não podemos afirmar muito sobre suas razões e/ou desrazões. Podemos somente reafirmar que faz parte de nossos arquivos históricos, as inúmeras formas (a depender de épocas históricas) de se fazer mal ao outro, de se deixar fazer mal e até de se fazer mal a si próprio. Não há convívio sem conflitos e para vivermos todos precisamos de um jeito ou de outro, negociar com nossa economia destrutiva tanto quando ela se dirige a nós mesmos quanto aos outros. Mas assim como o que muda na história são as formas do “mal”, para cada um de nós estas negociações ficam atadas ao complexo processo de nos tornarmos gente. Na reunião de condomínio citada acima, o síndico emprestou suas palavras para dar um sentido aos distúrbios entre os moradores, delimitando ao mesmo tempo as responsabilidades que cabia a cada parte, inclusive ao condomínio enquanto regulador desta convivência. Também minha amiga negociava consigo mesma os “custos” de sua solidariedade para com a colega. São estratégias de reconhecimento que, se por um lado podem funcionar como moduladores da violência, estão cada vez mais sujeitas à possibilidade ou não de existir um “outro”, um terceiro, capaz de ajudar a constituir (no plano psíquico) ou fazer as vezes do espaço ético necessário à convivência humana (no plano social). Nem a bondade nem a maldade habitam lugares predeterminados em nossos cérebros. Elas são construções categoria 3D  Não nascemos bons ou maus. Comecemos, pois pela admissão de que todos podem “cometer” o mal.

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