terça-feira, 18 de junho de 2013

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Dos filmes indicados ao Oscar 2013, apenas “Os Miseráveis” estava na prateleira aguardando certa reticencia minha a encarar esta versão musicada da obra de Victor Hugo. Talvez porque tendo assistido a versão anterior estrelada em 2000 nos cinemas com Gérard Depardieu encarnando Jean Valjean e John Malkovich o de seu algoz Javert, minha curiosidade se restringisse ao esmero desta nova produção e ao recorte dado aos cinco volumes da saga publicada pelo autor em 1862. Finda a sessão, no entanto, percebi que minha resistência também passeava pela aridez deste período da historia, por sua miséria real, social e moral. Sem recursos financeiros de qualquer ordem, sem opções de trabalho, sem direitos, restava “aos miseráveis” franceses acreditarem serem visíveis para um Deus solidário e benevolente. Se Deus se importasse, não só valeria a pena viver, mas desejar ser um ser humano, e quiçá melhor. A biografia de Victor Hugo impressiona não só pela sua extensa e diversificada produção literária, ativa até o final de sua vida, (é dele p.e. “O Corcunda de Notre Dame”), mas por seu ininterrupto engajamento nas lutas políticas e ideológicas do século XIX, arauto declarado da democracia liberal e humanitária. Exilou-se nas ilhas de Jersey e Guernesey durante todo o segundo Império de Napoleão III (quase vinte anos), retornando somente após a sua queda, muito aclamado pelo povo francês. Revisto assim, desde o século XXI, Victor Hugo foi um destes homens de espírito livre em um tempo sombrio, que ousou defender suas ideias, escreveu como e quanto quis e viveu apaixonado pela vida, apostando em dias melhores. No entanto, assistir ao seu épico “Les Miserables”, se pode produzir um grande desconforto pela dramaticidade pungente daquelas vidas com destinos tão estreitos, também causa um grande alívio, quando medimos quão distantes estamos deste mundo sem leis, sem liberdade, sem oportunidades e porque não, sem conforto. De lá para cá, neste mesmo mundo, promovemos grandes transformações físicas e sociais que nos permitiram aumentar  e muito nosso tempo para cuidar e saber mais sobre nós mesmos. O próprio verbo “consumir” só tem sentido quando pensamos que hoje, ao nascer uma criança, é muito provável que ela já venha acompanhada de desejos de adultos que a anteciparam e sonharam para ela uma vida cheia de bons momentos e muito sucesso. Seja lá o que isso possa significar para cada adulto que investe sua criança com seus sonhos. A capa da revista americana Times de 9 de maio de 2013 chamava a atenção para a Geração “Me Me Me” ou Millennials, ou seja, aquele 1/3 da população mundial  que nasceu entre 1980 e 2000 e que possuem características próprias por seu uso da tecnologia e pela maneira com que se relacionam com a felicidade. Esta geração que estaria desconstruindo de forma radical antigas maneiras de viver mereceu uma extensa matéria que cruzava resultados de diversas pesquisas e batizava-os de narcisistas (ou autocentrados) e preguiçosos e, embora menos preconceituosos por conviverem com uma diversidade maior de pessoas, mais alienados politicamente e com suas vidas definitivamente atadas ao modo “rede” de funcionamento. Auto fotografar-se, postar informações sobre onde se encontram, com quem, o que estão fazendo, o que estão vestindo, comendo, pensando ou sentindo através de seus smartphones, os define. Com um tom cético, a matéria não parecia vislumbrar um mundo melhor “dirigido” por esta geração. A jovem americana Zara Kessler, de 22 anos, editora de opinião da rede “Bloomberg” saiu em defesa de sua geração, marcando as diferenças de épocas e lembrando que todas as gerações de jovens podem ser analisadas sob o estranhamento dos adultos que foram jovens em tempos anteriores. Mais que isso, ela pontuou algumas dessas diferenças, a começar pelo plano dos ideais vigentes nas sociedades atuais, que estariam vetados à sua geração como certas profissões antes celebrizadas, salários altos, aquisição de casa própria e bens materiais, etc. Não haveria no horizonte do mundo futuro, esta mesma aposta que já foi de gerações anteriores. Podemos acrescentar aos itens citados o fato de que a tão badalada “autoestima” , caçada por sua geração como se fosse condição de sobrevivência, é antes de mais nada um produto dos desejos dos pais. A felicidade que todos sonhamos para nossos filhos os faz presa desta busca, o que na maioria das vezes não corresponde ao que realmente sentem ou pensam de si. Ao contrário, é com muito “suor” que os jovens desta geração buscam  reconhecer seus recursos, talentos e falhas para poderem, enfim, vislumbrar alternativas possíveis de vida, de amores, de trabalho. No mundo de Victor Hugo, muita coisa ainda precisava acontecer, mas a grande maioria hoje delas nos parece óbvias. Zara Kessler, com seus 22 anos, não sabe ainda como vai ser o mundo futuro. Nós também não. Mas vai ser muito diferente deste.

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