Quem assistiu ao filme
“Ela”, que concorreu ao Oscar deste ano, pode devanear sobre a ideia de um
futuro mundo virtual irresistível, em que nós humanos nos encantaríamos –
leia-se ficaríamos totalmente submetidos - com o requinte e a sofisticação da
tecnologia digital. “Ela”, no caso, é
Samantha, um aplicativo que tem a voz e o jeito de falar da atual musa sexy
Scarlett
Johansson e que consegue deixar o triste e melancólico Theodore (Joaquin
Phoenix), recém-separado, totalmente apaixonado. É engraçado pensar como nossas
comédias românticas, gênero que sempre se deu bem sem exigir grandes verbas ou
efeitos especiais, têm como tarefa se reinventar indefinidamente em busca de
cenários que possam ser facilmente identificados por todos, homens e mulheres,
desde que saibam ajustar/atualizar as velhas dores de amores, de solidão e vazio.
No caderno da Folha Ilustrada de 18/03, diante do fracasso de bilheteria do
filme “Refém de uma paixão” que tem como protagonista a atriz Kate Winslet- a
mesma do super-romântico e bem sucedido “Titanic”- havia um questionamento
sobre o “fim” da era de sucesso dos filmes românticos. Será? Não acredito muito
nisso. É provável que o roteiro não tenha sido feliz, já que o romance, ao
contrário, continua a ter um lugar de honra em nossas vidas até porque elas
(nossas vidas) seriam bem chatinhas sem seu frisson. Pode ser que o fato
inédito de vivermos em um tempo do imediato - tal a velocidade com que nossas
vidas ganham novas e inesperadas maneiras de estar no mundo - faça com que as cada
vez mais novas gerações reivindiquem respostas/soluções mais rápidas e
eficientes para seus impasses. Outro dia uma jovem de trinta e poucos anos me
dizia que estava vivendo na era do aturdimento. Sentia-se perdida com tantas questões
que lhe assolavam as ideias. Estava sem namorado e cada vez que uma amiga
“solteira” começava um relacionamento mais duradouro, percebia um friozinho em
sua barriga. O que seria dela? Não havia no horizonte nada que pudesse lhe
garantir que em pouco tempo alguém ocuparia este lugar, tão desejado, de
companheiro de vida. Por outro lado, nem sempre estava disponível para saídas durante
a semana com o pessoal do trabalho, que muitas vezes significava chegar tarde,
cansada e um pouco alcoolizada, sem poder mexer na hora do despertar do dia
seguinte. Além disso, apesar de estar finalmente trabalhando onde desejava,
ficava apreensiva quanto à possibilidade de não corresponder às expectativas da
empresa, o que a fazia trabalhar com muito mais empenho e aflição. Quando
pensava na possibilidade de não se casar, ou ter filhos e família, de novo
vinha o friozinho na barriga. E se assim fosse? O que seria dela? Fracasso total?
Duro mesmo era aparecer nos eventos familiares, ter que responder sobre seu
atual “estado civil” e suportar com alguma força possível, os olhares
compadecidos dos mais velhos. Saía arrasada. Os únicos momentos de muito
entusiasmo ficavam por conta das reuniões com as melhores amigas, que irmanadas
em suas aflições, podiam lamber as feridas umas das outras. Não que sua vida
fosse ruim. Suas férias sempre eram muito esperadas e planejadas com destinos
incríveis, tinha um rol de amigos e amigas muito queridos, seus feriados já
estavam comprometidos com pequenas incursões para lugares inusitados em
companhia de amigos diversos, mas...tudo parecia ficar sem sentido quando ela
se lembrava de que ainda não encontrara seu par. Fiquei sim aturdida com seu
relato. Não me parecia que faltasse a ela uma vida com alguma alegria. Mas ela
guardava, com muita convicção, um espaço especial ao seu “estado civil”. Com
muito romance, a ideia de ter “alguém especial” estava totalmente atrelada à
possibilidade de ser feliz. O que vocês acham?
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