segunda-feira, 2 de junho de 2014

O lobo do homem

Quase todos devem ter ouvido algum comentário sobre o polêmico filme O Lobo de Wall Street, baseado na biografia de Jordan Belfort e dirigido por Martin Scorsese. O filme começa com o próprio protagonista, na pele de Leonardo DiCaprio, anunciando sem muitas milongas, o tom de excessos que suas memórias irão tocar, ao revelar o estilo de vida pouco convencional de muita grana, sexo e drogas a partir de seu sucesso financeiro. Belfort é o lobo que consegue fazer fortuna operando ações negociadas fora do pregão, de preços baixíssimos, mas de altíssimo risco, nos anos noventa, anos dourados da bolsa nova-iorquina em que a regulação e os limites eram tênues e podiam ser subornados. Inicialmente operando em Long Island, logo o escritório da Stratton Oakmont ocupará o coração de Wall Street, e atrairá os olhares fascinados de milhares de corretores dispostos a fazer parte de seu circo e ganhar muito dinheiro. Um circo, que visto de perto mais parecia um misto de hospício e bordel, sustentado pelo carisma do showman Belfort, que em seu palco e de microfone em punho comandava sua trupe, mantendo a ganância e a ambição de todos, motor das compras e vendas de ações. Em troca, pílulas, prostitutas e diversão “full time”. Há um quê de orgulho, sem sombras de julgamentos morais, que Belfort exibe ao falar de si em suas memórias, uma aura que ele próprio se concede como se ao conseguir a proeza de quase ganhar um milhão de dólares ao ano com apenas 26 anos, ele teria cruzado as inalcançáveis portas do paraíso e realizado o “sonho americano” de habitar as terras divinas do excesso, do exagero e da inconsequência, sem medo de ser feliz. A única imagem que o filme mostra do ainda ingênuo Belfort, quando começa a trabalhar em Wall Street, um pouco antes da crise do final dos anos oitenta, é um almoço com o então chefe, que lhe diz para ficar muito atento a única regra daquele jogo: vender a qualquer “custo”, não importa a quem, porque ou quais serão os resultados para o comprador. A receita para suportar o ritmo e o clima de montanha russa é muita maconha e masturbação. De certa forma ele não só segue as regras à risca, como as inova, quando recomeça do zero em Long Island. Indicado ao Oscar, o filme foi bem de bilheteria, tendo Leonardo DiCaprio disputado o premio de melhor ator. Com tal destaque, algumas entrevistas que o ator concedeu reivindicavam sua posição diante do comportamento de seu personagem, ao que DiCaprio lembrava que não se tratava de legitimar seu modo de encarar a vida e sim de retratar os obscuros (e quase nunca revelados) lados da alma humana. De fato o ator está ótimo em sua interpretação e empresta ao personagem um tom certeiro entre o infantil e o cafona, ao destacar a maneira como ele aposta 100% em seus métodos de venda e na possibilidade das pílulas lhe garantirem a energia para aquela vida alucinada e viciante. E por falar em vício, para o espectador atento, não só as drogas, mas o sexo, o dinheiro e o ritmo das negociatas vão, aos poucos, tomando um lugar central na vida de todos os envolvidos, funcionando como objetos “perfeitos” de gozo, anestesiantes, que emprestam um sentimento de invulnerabilidade, mas que, ao contrário do que lhes parece, impede-os de pensar, perceber, refletir, enfim viver a vida. Um perigoso, embora audacioso, namoro com a morte.
Para conferir: O Lobo de Wall Street ( USA 2013)
Direção: Martin Scorsese

Elenco: Leonardo DiCaprio e Jonah Hill

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