domingo, 22 de novembro de 2009

Homens e Machos

Há um consenso em torno do fato do século passado ter sido palco de conquistas político-sociais importantes tanto para as mulheres quanto para os gays. No Ocidente em geral, há hoje leis que protegem os direitos conquistados por ambas as categorias, o que certamente fará com que as novas gerações nasçam com estes valores já consolidados, que acabam se tornando verdades ao serem inseridos na cultura. Já o século XXI tem reclamado um olhar mais apurado para o lugar dos homens. Com espaços e referências quase absolutas, eles viram seu antigo “habitat natural” que já vinha com regras, manual de instruções, rituais de confirmação, roteiros pré-estabelecidos, ser lentamente desmantelado. Por todos os lados assistimos filhos, pais, jovens, idosos, estudantes ou profissionais vivendo entre este modelo arcaico e geralmente inadequado ou se aventurando a buscar novas referências, construir novos lugares. São pais que já não sabem bem como ser um bom modelo de homem para seus filhos, ou jovens que questionam os velhos rituais do bom macho. Velhas frases, antes tão repetidas por todos tornam-se obsoletas: homens não choram, não cozinham, não cuidam de bebês, não dividem as despesas com suas companheiras, não recusam convites para transar, não ligam para a própria aparência, não cuidam de seus corpos,são sempre corajosos, destemidos e em geral brutos. Não há como negar que estas exigências tradicionais devessem significar um alto custo para a imagem de cada um.Todos precisavam estar aptos a entrar nas arenas masculinas e batalhar por poder, prestígio e principalmente pelo reconhecimento dos outros homens. Estes eram os valores que a cultura tradicional confirmava como sendo viris. Na cultura atual há uma busca de todos por prestígio e poder (homens, mulheres, homossexuais ou não) e muitos dos antigos caminhos masculinos são vistos como imposturas. A maioria dos homens se vê jogado em um revolto alto mar e incitado a aprender a nadar rapidamente. O reconhecimento passa necessariamente por uma árdua conquista do lugar que cada um deverá ocupar e não está mais dado por antecipação. Até os filmes atuais começam a dar espaço para os novos dramas masculinos e suas tentativas de soluções. Entrou em cartaz na capital “À procura de Eric”, do diretor inglês Ken Loach. Os homens mais ligados ao futebol se lembrarão do ídolo Eric Cantona que nos anos noventa arrasava no “timão” dos ingleses, o Manchester United. Pois neste filme ele próprio protagoniza um “anjo da guarda” de um carteiro que também se chama Eric, cuja vida está tão sem sentido que a única solução à vista é dirigir seu carro em alta velocidade e na contramão até “morrer”. Sem conseguir morrer, o carteiro que foi abandonado pela segunda mulher ( que o deixou com dois enteados), chama a atenção de seus colegas de trabalho que decidem pensar em estratégias para ajudá-lo. Em um ritual sugerido por um livro de auto-ajuda, eles são convocados a pensar, cada um individualmente, quem seria a figura de um homem que eles admiram ao qual eles imaginam que teria feito coisas que eles valorizam. Claro que nosso Eric elege como seu ídolo maior aquele que habita um pôster em seu quarto, o Cantona cujos passes e gols estão todos gravados em sua memória. É ele quem irá imaginariamente (e de forma bastante sensível) “papear” com o carteiro, fazendo com que este confesse suas mais humilhantes memórias, aquelas das quais se envergonha justamente por não ter correspondido ao ideal de homem que ele achava que seu pai exigia, ou que sua amada esposa ( a primeira e mãe de sua filha) esperava dele. Um filme feito por homens e dirigido aos homens, que levanta questões que afligem a todos nós na era atual. De certa maneira é a “irmandade” de carteiros que possibilitará à Eric o acolhimento necessário para que ele se sinta homem, não mais com “H” maiúsculo, apenas um homem capaz de amar e ser amado por aqueles a quem ele admira.

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