terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Retrospectiva

O final do ano de 2009 ficou marcado pela fúria com que a Natureza reagiu à ocupação de seus espaços sem uma política que inclua um cuidado e uma análise sobre a sua sustentabilidade. E por tabela nos ofereceu a oportunidade de refletir sobre os nossos tempos, nosso país e nossa cultura. É comum assistirmos filmes em que são retratadas as diferenças culturais entre a Europa e os USA, ou ainda entre os países do Velho Mundo com sua tradição aristocrática e as Américas, este Novo Mundo que passou a fazer parte da história das civilizações somente a partir do século XV, e inventou novos modos de viver ao ter que desbravar territórios virgens, se adaptar a diferentes climas e escolher incluir, excluir ou se misturar aos seus nativos. Também são comuns as análises entre as diferenças culturais das Américas a depender de seus colonizadores: Espanha e Inglaterra foram hegemônicas em suas conquistas e coube a nós sermos parte de Portugal. Tal resumo pretende apenas marcar nossas idiossincrasias, fruto destas heranças históricas que incluem uma mistura singular da cultura e da política de nossa colônia portuguesa, com o clima quente e a exuberância de nossa natureza, para pensar o Rio de Janeiro como o reduto que mais se aproxima desta vertiginosa alquimia. De passagem por esta cidade no início deste ano, andei por suas ruas apreciando seu cenário natural imponente, atenta aos sons de suas ruas fartamente habitadas. Ocorreu-me que a partir de meados de dezembro até o carnaval algumas cidades do Brasil se transformam em territórios super povoados de pessoas que buscam aproveitar este mix de feriado, sol, praia, diversão, o que marcaria uma entre muitas de nossas diferenças com o Norte do hemisfério global, que enfrenta neve e temperaturas baixíssimas neste período do ano. Os que já viveram em países mais frios e cinzentos sabem como o sol e sua luminosidade podem fazer diferença nos humores e nos amores. No Rio de Janeiro desfilam tipos caricatos que compõem nossa brasilidade, aquela que apesar de nossos protestos encanta a grande parte dos estrangeiros, seja por sua cordialidade espontânea, pela hospitalidade (muitas vezes temperada com certa displicência e muita precariedade) ou pelo interessante convívio entre classes e etnias. Além disso, o jeito carioca de ser inclui a espantosa mistura entre as precauções diante da ameaça constante de assaltos ou conflitos entre polícia e traficantes, ao lado de uma extrema confiança na capacidade de cada cidadão em exercer a solidariedade. Basta perder-se por suas ruas e praias para perceber que seu povo faz ativamente uma troca espontânea de cuidados, sugestões e conversas, o que passa a idéia de que cada um sabe da existência do outro e aposta que pode contar com ele. Longe de tentar complexizar estas constatações ou articulá-las aos nossos mitos de origem, a maneira com que as pessoas se relacionam umas com as outras, os estilos das trocas que fazem e a capacidade destas de transformar estranhos em conhecidos ou em pessoas íntimas, inimigos em amigos, amigos em melhores amigos, não é pouca coisa. Solução imaginária para tensões, conflitos e contradições que não encontram caminhos para serem resolvidos na realidade? Pode ser. Se formos este povo meio indeterminado que reúne tantos contrastes ( étnicos, religiosos, sociais) impossíveis de se ajustarem, talvez nossa propagada “ginga”possa auxiliar-nos a constituirmos um coletivo ( rede) à qual lá no íntimo acreditamos fazer parte. No excesso do calor ou das chuvas ainda podemos apostar em um 2010 que nos faça mais sentido.

Nenhum comentário:

Postar um comentário