quinta-feira, 20 de maio de 2010

As medidas de cada um

Meu percurso diário inclui atravessar um trânsito carregado, produto do excesso de carros em torno de uma grande escola particular do bairro. Acostumei-me assim, a prestar atenção aos estudantes (do colegial) que cruzam as ruas e calçadas à sua volta. Ainda que, em geral por motivos de segurança, a maioria dos pais, zelosos, leve seus filhos de carro ou contrate transporte escolar, há sempre alguns que vão a pé. Destes, a maioria são meninos e muitos caminham sozinhos. As meninas, em geral, vão em turma de duas ou mais e o clima entre algumas costuma ser animado, com muita conversa e risadas. Quanto aos que estão sós, há os que são mais populares e à medida que se aproximam do agrupamento que se forma nos portões já se anunciam ou são chamados pelos colegas. Mas há sempre aqueles “solitários”. Seja por serem esteticamente menos favorecidos ou simplesmente mais inibidos, suas feições são em geral mais sérias, seu andar mais rápido e cabisbaixo. Quase sem me dar conta, passo a imaginá-los mais frágeis, com mais dificuldades para suportarem as “crueldades” que fazem parte deste convívio entre adolescentes, fenômeno que na atualidade chamamos de bullying. É neste imbricamento entre o adolescente, sua família, sua escola e o mundo, que se dá o jogo de xadrez das experiências que em geral são boas e ruins, causam alegria e sofrimento, mas principalmente muita angústia, e às vezes são vividas em tons excessivos, além do que aquele (a) jovem pode suportar. Há os que militam os comentários irônicos, ou até sarcásticos, outros que se utilizam de um humor menos cáustico e mais acolhedor; de outro lado muitos podem ouvir e retrucar quando atingidos em seu orgulho ou imagem, outros sucumbem e se recolhem amargurados, alguns sentindo-se dolorosamente rejeitados. Estas são o que podemos chamar de “medidas” de cada um, e que estão relacionadas às próprias histórias e a maneira como cada qual conseguiu se virar para dar conta destes excessos ou carências que todos vivemos. Neste sentido em poucas décadas a Escola, que antes era apenas um espaço de aprendizagem e preparação para a aquisição de um futuro profissional, teve que desconstruir suas antigas bases e abrir-se para um fórum permanente de reflexões sobre as novas formas de se estar no mundo, e incluir, ao lado da Família, um “cuidar” de seus alunos. Verbos como acolher, reconhecer, questionar, interpelar passaram a ser comuns e entre família e escola, as “medidas” tiveram que ser repensadas. Tanto a escola quanto a família precisaram deixar de ser normativas para tornarem-se vivas, o que convenhamos, não é coisa fácil já que tendemos sempre a eleger uma norma,algo que possa ser um guia para nossas ações e julgamentos, ao invés do risco que o encontro e a troca anunciam quando há urgência em resolver dúvidas, aplacar angústias ou decidir competências. E tornar-se “viva” dá muito trabalho porque precisamos deixar as antigas “medidas” que nos ajudavam a repartir de forma mais objetiva as responsabilidades de uns e de outros, para estudar caso a caso, suas motivações, suas implicações e possíveis soluções. Algo que faça sentido para todos os implicados.

Nenhum comentário:

Postar um comentário