Em uma entrevista concedida a Marilia Gabriela o
diretor do filme “Colegas” que está estreando em circuito nacional confessa que
a ideia de criar um roteiro protagonizado por atores com Síndrome de Down era
um sonho antigo, uma homenagem amorosa ao tio materno, portador da mesma
síndrome, de quem ele tinha lembranças intensas, de alguém generoso e muito
divertido. Mais, seu filme deveria recriar o clima de aventura que ele guardava
dos momentos em que brincavam juntos. Entre a ideia, o projeto (com tudo o que
isso significa em termos de roteiro, seleção de atores, captação de recursos, etc.)
e a consolidação do sonho, com direito ao premio de melhor filme no festival de
Gramado de 2012, passaram-se sete anos. Na entrevista, realizada com o diretor
e os três atores, Marcelo Galvão conta que sua intenção sempre fora tentar
passar para o público os mesmos sentimentos que guardava em relação a sua
convivência com o tio, ou seja, de como o laço amoroso que os unia ignorava as
diferenças entre eles. Embora a Síndrome de Down - um distúrbio
genético caracterizado pela presença do cromossomo 21 adicional em todas as
células do organismo - seja bastante conhecida por suas características físicas
específicas e pelo desenvolvimento geral mais lento de seus portadores, o comportamento
e a personalidade de cada um ficam muito mais submetidos às influencias do meio
familiar e cultural a que pertencem. Isso fica claro na entrevista dos três
protagonistas que a despeito de partilharem algumas dificuldades, vão narrando
suas historias de vida, com suas conquistas e dores, como as nossas. Ou seja,
mostram que podem ser pessoas ricas ou pobres, cultas ou sem instrução, felizes
ou infelizes. Se por um lado o filme pode circular exibindo apenas o rótulo de uma
comédia romântica bem ao estilo “queremos, logo podemos” tendo como fundo a
força dos sonhos de cada um, certamente os prêmios, o marketing e o espaço que
a mídia está oferecendo a ele poderão funcionar como uma chamada ao polêmico
tema da inclusão de pessoas com deficiência em diversos
âmbitos da sociedade. Lembremos que essa é uma ideia nova, que tem apenas
algumas décadas, e por isso mesmo está longe de amparar todos os que precisam
desta “inclusão”. Destes, destacamos os pais, para os quais os desafios desta
jornada são vividos com muito desamparo, inúmeras incertezas, sentimentos confusos e
contraditórios. O que fazer? Como oferecer a seus bebes um futuro promissor? O
que é melhor, lutar para que sejam aceitos em escolas regulares e enfrentem as
discriminações ou isola-los em classes ou instituições com seus pares? E quando
alcançarem a adolescência? E se quiserem se casar? Qualquer um que se puser no lugar
destes que perguntam poderá imaginar a
dor que enfrentam e as diferenças com as quais cada família tentará contornar a
perda do “bebê perfeito” e enfrentar a nova e inesperada realidade, que no
mínimo lhes exigirá muitas mudanças. Por
isso, talvez o maior valor da ideia deste filme seja a sensível experiência de seu
diretor, que graças a convivência amorosa com seu tio, soube ser possível transformar
um pré-conceito muitas vezes tácito e silencioso, por isso mesmo mais danoso do
que podemos perceber.
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