quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Reclame aqui

Eram amigos há muito tempo, “brothers” de alma, em uma relação em que reinava o respeito e a camaradagem. Na época da faculdade fizeram escolhas diferentes, um seguiu para as ciências da economia e administração e outro se enveredou pelos caminhos das humanidades. Deram-se bem, ambos. E seguiram juntos, alimentando o convívio, agregando os novos amigos e as namoradas. Coisas de jovens das gerações mais novas, sempre que um entrava em alguma nuvem cinza por qualquer motivo, o outro era o parceiro que socorria. A senha era aquele bar dos velhos tempos e as geladíssimas cervejas “Original”. Uma troca que significava muito para os dois. As diferenças de pontos de vistas já eram antigas e tratadas com certo humor, mas com o passar do tempo suas visões de mundo e de futuro se distanciaram. Na eleição para presidente do Brasil de 2010, no embate entre os candidatos do PT e do PSDB, ficaram em lados opostos, travaram vários debates, tentaram achar um território comum e sobreviveram à decepção de um e ao sucesso do outro. Nos anos que se seguiram retomavam vez em quando suas posições, mas acabavam desistindo de levar adiante qualquer ameaça a amizade. Quando o cenário eleitoral deste ano se transformou em guerra acirrada entre os dois partidos que disputavam novamente as eleições presidenciais, o caldo entornou. Na exposição a céu aberto das redes sociais, o botão “modo paranoico” de ambos foi acionado. Qualquer texto ou notícia compartilhada que denegrisse o partido de um, era sentido como traição pelo outro. Sentindo-se injustiçados, para ambos o “outro” passou para o campo do inimigo. Na lógica binária do modo paranoico de existir, a verdade estava do “meu” lado. Como era possível “ele” não perceber e colocar em risco uma amizade de tantos anos? Como e quando “ele” se tornara aquela pessoa tão odiosa que não se importava com os “meus” projetos de vida? A paixão do ódio impediu-os de pensar. A cada cutucada, dez tiros. Whatsapp  bloqueado e, no silencio das vozes, o Facebook se tornou o campo de batalha, acionado milhares de vezes para conferir o ranking das ofensas de cada lado. Na ânsia da vitória final para o dia 26 de outubro, ambos se “jogaram” na militância de seus partidos, aliciando cada amigo (a) ou conhecido (a) de sua lista. Era tudo ou nada, vida ou morte. Para os poucos que ousaram questionar, a resposta era automática: “ele” começara. O clima de empate que dominou os dias que antecederam o domingo da eleição só aumentou a tensão e o desejo pela vitória de “seu” partido. Não era esperança, mas certeza! No rebuliço da alma de cada um ardia a quietude prazerosa da vingança, só suplantada quando o resultado das urnas confirmasse o que cada um já sabia: seu candidato vencera!      

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