Duas notícias desta semana que passou podem nos levar a refletir sobre um certo círculo repetitivo que acompanha as ações humanas. No primeiro aniversário do ataque às torres gêmeas dentro do governo Obama, ele instituiu o "Dia Nacional do Serviço e Memória" e pediu aos americanos que tentassem se envolver em projetos comunitários e ações voluntárias como cozinhar refeições ou comprar alimento para os pobres, plantar e arranjar jardins, ajudar em reparações de casas velhas, completar material escolar para crianças desfavorecidas,etc. Ao fazer este apelo, Obama lembrou o espírito de solidariedade de todos que se empenharam em ajudar e acolher as vítimas e seus parentes nos dias que se sucederam àquele trágico ataque terrorista. Alguns jornais avaliaram seu gesto como uma preocupação em se afastar de uma atitude de vingança contra o Islã como fez seu antecessor, ao despejar um exército de jovens americanos, primeiro no Afeganistão e depois no Iraque. Outros preferiram divulgar a voz dissonante de Obama que desde o ataque em 2001, então um desconhecido senador, preferiu incitar a todos a refletirem sobre a origem daquele ato de loucura, que certamente deveria ter uma história e uma explicação para suas motivações. A outra notícia também divulgada há poucos dias, diz respeito a uma certa preocupação de alguns setores da economia mundial, que diante da aposta de uma retomada pós-crise, passou a temer que as instituições financeiras voltassem a produzir novas e mais apetitosas estratégias de investimentos, vendendo lucros que em algum momento poderiam denunciar seu engodo. Não é tão difícil perceber o fio que liga estas duas notícias, ou seja, a incerteza que assola a todos diante de fatos trágicos e aparentemente inesperados, que tal e qual um “tsunami” tem efeitos devastadores sobre a vida de um número considerável de cidadãos comuns, possibilitando a abertura de um breve espaço em que todos são convocados a repensar sobre a “verdade” de suas escolhas, valores e ideais, mas principalmente sobre a fragilidade das regras que sustentam a convivência humana. Se a vida em sociedade é uma condição de sobrevivência para a nossa espécie, ela paradoxalmente contraria os interesses individuais, pois exige a imposição de limites e renúncias principalmente de nosso ódio e de nosso desejo de destruição. Prisioneiros de nossa ambivalência sabemos o quanto as nossas mais estreitas amizades estão sujeitas tanto ao mais intenso ódio quanto a mais profunda generosidade. É justamente por isso que a paz depende sempre de um consenso sobre os ganhos da instauração das leis, da comunidade e da civilização e é também por isso que sempre que a lei é questionada, desrespeitada ou que deixe de fazer sentido, entramos no terreno pantanoso das violências e dos interesses individuais, desfazem-se os pactos de convivência e assistimos desde pequenas injustiças até os mais escabrosos atos de violência ou de descaso para com nossos semelhantes. Tanto a disposição de Obama em apelar para a formação de uma rede de ajuda aos necessitados, quanto a preocupação de alguns em alertar sobre o retorno da ganância financeira são tentativas (ainda que precárias e provisórias) para regular as relações sociais visando uma vida boa e justa tanto para os indivíduos como para a comunidade em seu todo. Admitir a persistência humana em reparar seus atos de violência ou em criar o “belo” e o “bom” não deixa de ser alentador, pois nos dá chances para apostar que nosso mundo, em sendo uma versão de nosso imaginário, está a disposição para ser modificado tanto para melhorar quanto para piorar a vida em sociedade.
coluna do dia 16 de setembro de 2009
quarta-feira, 16 de setembro de 2009
quarta-feira, 9 de setembro de 2009
Quem quer ser Norminha?
Podemos dizer que, em menos de duas décadas, passamos a ser assediados por muito mais informações do que as que podemos digerir. A internet revolucionou hábitos, profissões, encontros, e até o tempo que levávamos para fazer algumas coisas. Um mundo virtual pode sair pela telinha de nosso computador ou pelos celulares oferecendo o que acontece e existe em toda extensão de nossa aldeia global. Isso sem contar com os livros, filmes, peças teatrais, revistas, quadrinhos, jornais ou a TV, ainda a grande responsável pelo bombardeamento de lançamentos e novidades. Tal número de informações pode nos trazer a sensação de que não há mais o que se saber, fazer ou querer, que tudo já foi dito ou feito. Mas a verdade é que em matéria de amores e sexo, a maioria de nossas histórias parecem ser sempre as mesmas e o que as diferencia é ‘como’ elas são contadas, ou recontadas. E quando elas têm algo a dizer, perturbam nossa alma provocando paz ou agonia e podem nos surpreender, nos emocionar ou nos fazer rir. Em clima de última semana da novela das oito, vale a pena colocar em pauta o tumulto que a personagem Norminha provocou, dividindo a opinião de homens e mulheres, ao ser porta voz de um debate inusitado sobre um tema delicado e em geral pouco divulgado: a infidelidade feminina. Graças a sensibilidade da autora, que por ser mulher soube cuidar da composição de sua personagem, Norminha conquistou a simpatia do público ao encarnar, faceira, a mulher casada que gosta do maridão, mas também adora sapecar pelos bailes da vida, exibindo sua sensualidade e provocando os olhares desejosos dos homens. Não por acaso, a atriz Dira Paes e o ator Anderson Müller, responsáveis pela dupla que compõe a mulher fogosa e o pacato marido, foram assediados pela mídia e concederam inúmeras entrevistas espalhadas por blogs, jornais e TV, em que são alvos da curiosidade sobre o desfecho da trama e o destino da ousada Norminha. Ao ser chamado a opinar, também o público (homens e mulheres) não a condenou unanimemente como se poderia esperar. A atriz bem que tentou entender o que se passava entre Norminha e seu público, arriscando-se a explicar por que, apesar do tema da “traição” ser caríssimo para a maioria das pessoas, a espevitada senhora acabava amenizando os debates. Bem casada, Norminha é a esposa dedicada, que cuida e trata o marido a pão de ló, além de mantê-lo longe do olhar das outras mulheres, ao mesmo tempo em que se permite esbanjar sensualidade, fazendo uso de todas os recursos femininos que agradam aos olhares masculinos: vestidos justos que marcam seu traseiro, decotes que mostram sutiãs vermelhos e seios fartos, saltos altos que dão um hit a mais ao andar, bocas e cabelos ao gosto do pecado. Com todo este arsenal, ela consegue arrancar risos da maioria, não só por inverter a lógica que imperou no imaginário social até agora (aos homens tem sido permitido serem perpétuos conquistadores), como por ser a caricatura ( ou seja, a figura do excesso, do humor) da mulher fatal. Em um passado não tão longínquo ( há quase dois séculos), a exigência legal da fidelidade das mulheres casadas foi articulada à figura da mulher-mãe quando os casamentos passaram a ser regulamentados pelo Estado. Tal lei foi caducando na medida em que as mulheres foram conquistando seu lugar de direito, junto aos homens. Ainda que as convenções sociais ligadas ao regulamento do exercício da sexualidade humana mantenham sempre um anseio de se “naturalizar”, servindo de referencia para a convivência entre as pessoas, tudo o que gira em torno do sexo insiste em provocar constrangimentos, inibições ou transgressões que não são fortuitas. Norminha consegue romper as barreiras do silêncio sobre os desejos femininos, ao mesmo tempo em que se apossa de seu “direito” de exercer sua liberdade sexual utilizando-se da via humorística ( poucos não riram do leitinho- sonífero que ela oferecia ao marido). Mais que isso, a fidelidade entre os casais nos dias de hoje só diz respeito aos pactos de lealdade que são firmados entre eles, cabendo a cada um se responsabilizar por seu cumprimento. Norminha conquista a cumplicidade do público não pela transgressão sexual, mas pela maneira “natural” com que sai em busca de um pouco de prazer, tentando não comprometer seu casamento. Assim, meio personagem de si mesma, ela faz o possível para conseguir o impossível: tenta fazer acordos com seus próprios desejos, sem precisar renunciar aos chamados morais de sua lealdade ao marido. Vamos assistir e conferir!
coluna do dia 9 de setembro de 2009
coluna do dia 9 de setembro de 2009
quarta-feira, 2 de setembro de 2009
Caminho da loucura
Se existe um produto cultural que adentra não só nas casas, mas nas falas diárias de seus expectadores, são as novelas exibidas nos horários noturnos considerados nobres. Podemos comprovar tal afirmativa, escutando aqui e ali como os personagens da atual novela Caminho das Índias estão presentes nas cenas do cotidiano de quase todos, oferecendo conteúdos para debates sobre os destinos das relações amorosas de seus pares ou sobre os dramas e conflitos de cada personagem. A novidade cabe à proposta da autora em levar ao público a possibilidade de discussão da loucura apresentando a psicopata Yvone (encarnando aquela que se utiliza das pessoas sem demonstrar sinais de consideração ou culpa) e o esquizofrênico Tarso. O jovem Tarso, sua família, seu tratamento em clínicas especializadas, abriu espaço para mostrar como a doença psíquica é ainda hoje contestada ou encarada como algo ameaçador e estranho e como são ambíguos os caminhos escolhidos pelos familiares e pela sociedade para tratar deste tipo de sofrimento, muitas vezes negado. A própria permanência do termo “loucura”, utilizado fartamente para designar aqueles que pressupomos fugir aos nossos critérios de normalidade, já denuncia a distância que desejamos que exista entre o normal e o louco. Michel Foucault (filósofo francês) pretendeu preencher este vazio publicando uma minuciosa pesquisa sobre a História da Loucura em que mostra a evolução de seu entendimento social e como vão se modificando ao longo dos anos as formas de intervenção sobre ela, ao se deslocar lentamente o louco de uma posição de exclusão social absoluta, para a de um indivíduo com voz, capaz de dizer sobre si mesmo e de dar sentido a sua história e aos seus sintomas. A mudança de foco deveria consolidar a existência de uma pessoa e não uma doença, a ser tratada. Entretanto, continua não sendo fácil para nós, convivermos com uma linguagem por vezes “estranha” aos nossos ouvidos ou com comportamentos inesperados , que ousam desconstruir uma certa lógica que prezamos, causando-nos desconforto. Foi este estranhamento que permitiu a Freud perceber que a nossa consciência era insuficiente para dar conta da complexidade de nosso espírito humano, e apontar o descompasso entre o que produzimos e o que somos capazes de entender. Com isso, nosso equilíbrio psíquico sempre precário nos deixa muito próximos de nos sentirmos confusos, por vezes angustiados, descontrolados, perdidamente emocionados, etc. Esta tênue fronteira nos faz reféns de buscas incessantes que permitam tratar as dores psíquicas como entidades separadas de nossa subjetividade. O avanço da psicofarmacologia, por exemplo, embora tenha nos trazido oportunidades inimagináveis de acalmar ou de equilibrar nossa psique, comunga de certa tendência em reduzir o louco à sua doença, tornando-o um objeto passivo diante de um saber psiquiátrico, alienado de seus sintomas, à espera do retorno de seu estado saudável através do cumprimento de ordens ou de receitas de um especialista no assunto. Ao invés de um sujeito, uma série descritiva de sintomas descarta sua subjetividade e silencia seu sofrimento que produz incômodo. Seu delírio, por exemplo, não será aproveitado como sua possibilidade de falar de si, de narrar a sua história, e fica assim descartada a hipótese de ajudá-lo a criar um lugar legitimo de existência, auxiliando-o a construir um contorno, uma amarração de seu ser. A loucura já não tem mais nada a dizer. A subjetividade também não. Não há conflito, nem desejo, nem sofrimento, apenas uma supressão disso tudo e o vazio que daí resulta. Este é o paradoxo de nossas dores psíquicas: elas nos aproximam de um sentimento de estranhamento que nos ameaça e nos faz desejar que sejam algo que não nos pertença.O caminho das loucuras insiste em repetir seu percurso.
coluna do dia 2 de setembro de 2009
coluna do dia 2 de setembro de 2009
De riso fácil
No discurso de sua posse, no início deste ano, Obama ressaltou as mudanças positivas que houve em nosso mundo atual ao apontar o quanto havíamos avançado na conquista de nossa liberdade. Com um poder político mais descentralizado, grande parte das sociedades ocidentais pode promover uma maior liberdade de escolhas, ainda que fosse necessário um cuidado mais apurado com a responsabilidade que este exercício exige de cada um. Penso que a extensão desta liberdade conquistada pode ser avaliada pelo fato de hoje ser possível tratarmos assuntos tão sérios como o poder e a política de forma irreverente. Nossos chargistas que o digam, e não seria difícil lembrarmo-nos de cenas hilárias retratadas por eles, desde que pudemos reaver nossa liberdade de expressão com o final da ditadura militar. Papas, presidentes, militares, campeões de algum esporte ou de audiências, musas, mestres, não sobrou autoridades ou figuras públicas reverenciadas que não pudessem ser retratadas em charges ou tornarem-se personagens de piadas que hoje circulam livremente pela internet, ou que são contadas e passadas de boca em boca, fazendo a alegria de muitos (ou a fúria de alguns). Há quem não perca o texto diário do colunista autodenominado Macaco Simão, ícone do nosso humor escrachado, em que ninguém é poupado, dentro da máxima que diz que é preferível perder o amigo, mas nunca a piada. Claro que não estamos falando em unanimidades. Ao contrário, o humor é sempre polêmico justamente por trazer em seu bojo esta ambigüidade entre riso e choro, entre a reverência e o sarcasmo, entre o melhor e o pior. Mas sem dúvida somos um bom público para as piadas, que proliferam e são de certa forma bem digeridas por nossa cultura brasileira, o que conta um pouco sobre nossa maneira de não nos levar muito a sério. Isto porque para que haja este terreno propício para o humor, é necessário que a agressividade contida em seu interior, seja menos importante do que a possibilidade de nos sentirmos próximos daquele que está sendo o alvo das risadas, e ainda que isso não nos seja tão claro, é como se nos irmanássemos com os tropeços, os descuidos, as falhas ou as manias deste personagem. Por vezes, aqui e ali, somos objeto de análises de estrangeiros que aqui aportam e tanto podem apontar a falta de uma coletividade coesa em relação à cobrança e ao exercício dos valores civis e morais esperados para um bom funcionamento sócio-político, quanto um certo ceticismo em relação à eficiência das leis e à politacagem interesseira de nossas autoridades. De um lado a outro, nossa brasilidade acaba sendo despojada de orgulhos excessivos ou de pesares prolongados, o que nos torna alvo fácil de adjetivos não tão sérios. Uma colega argentina que escrevia sobre seu exílio brasileiro, descreveu com espanto a alegria muitas vezes inexplicável ou algumas atitudes cordiais e generosas inesperadas de nosso povo, comparando-as à sua cultura mais trágica e muito mais reivindicativa. Parecia-lhe mais fácil entender o samba aqui e o tango lá. Diferenças culturais com certeza, mas nem ao céu nem ao mar, parece que tanto nosso bom humor, quanto nosso ceticismo em relação ao que “deveríamos” exigir de nossos políticos ( e de nós mesmos) acabam por favorecer nossos laços. Assim, apesar de nossos preconceitos, nossas discriminações étnicas, religiosas ou sociais, nossa parca participação nos destinos de nossa política, acatamos nossas contradições. Isso permite que possamos rir de nós mesmos, ao não sacralizar nem o mal nem o bem, nem o inferno, nem o céu. Aqui é apenas o Brasil
coluna do dia 26 de agosto de 2009
coluna do dia 26 de agosto de 2009
quarta-feira, 19 de agosto de 2009
O aniversário de Woodstock
É no mínimo interessante ler ou assistir as diferentes reportagens que pretendem cobrir os quarenta anos de Woodstock, o festival que marcou época e tornou-se ao longo destes anos, objeto de análises e críticas de estudos da cultura. Há os que se lembram nostalgicamente da singeleza e ingenuidade dos jovens que ali aportaram, vindos de cada canto do USA, país que assassinara um ano antes seu líder negro que pregava a irmandade entre as raças (Luther King) e demoraria mais alguns para trazer de volta seus jovens sobreviventes à guerra do Vietnã. Outros preferem utilizar um tom mais sarcástico, acentuando o caráter de trocas humanas e de cooperação que emanava dali, mas que não teria sobrevivido à sedução capitalista que impôs uma convivência mais competitiva. Há ainda os que vaticinam contra a permissividade dos três dias de rock ,drogas e sexo, como se ali houvesse sido gerado uma nova (e para muitos,constrangedora) maneira de se viver a vida. Lenda? Legado? Ou produto de uma série de contingências e circunstâncias sociais e políticas que permitiram que quase meio milhão de jovens atendessem a um chamado para se reunirem ao som de algumas bandas? O que fez com que esta turba de jovens transformasse tal evento em um dos maiores acontecimentos do final dos anos sessenta, encenando um protesto pacífico contra a guerra e a favor da paz, ao levar a sério o amor como força de combate contra a ânsia de poder, o ódio e a violência? De certa maneira, há unanimidade quanto ao fato deste evento ter se tornado grande de maneira fortuita. Os próprios realizadores, por não esperarem uma resposta espontânea de tal porte àquele apelo banal, viram-se obrigados a entregarem a organização à sorte e ao acaso do destino, mas principalmente à responsabilidade de cada uma das pessoas ali presentes, músicos e bandas incluídas. Ninguém sonhava com a repercussão que esta convivência de três dias de sol, chuva e lama (possível tão somente graças à tolerância e a troca de gentilezas entre seus participantes) alcançaria para a cultura da época. Embora seja esperado que os aniversários destas datas provoquem reflexões, debates e análises sobre sua origem e importância, é fato que a história sempre sofre uma ressignificação quando interpretada a partir de um presente. Assim como olhamos nosso passado e podemos julgá-lo de forma diferente a cada década, acrescentando adjetivos que não podíamos perceber e apagando outros que perderam sua importância, hoje é possível analisarmos Woodstock como uma metáfora dos sonhos da geração pós segunda guerra mundial, um símbolo das mudanças gestadas lentamente no ocidente a partir do desejo e da crença de cada jovem na possibilidade de tornar melhor o mundo em que viviam. Um mundo que pudesse finalmente eliminar as diferenças entre os povos e aclamar sua irmandade, apostando na capacidade de cada um em se responsabilizar por suas escolhas e em respeitar a dos outros. Aos que fizeram parte desta geração e assistem a este momento emocionados (revivendo-o a partir do documentário Woodstock: 3 Dias de Paz, Amor e Música, de Michael Wadleigh) identificam ali seus ideais juvenis de apostas neste mundo possível. Para estes, Woodstock é a fotografia desta utopia, aquela foto- troféu que guardamos eternamente por sabermos que ela capturou um momento inédito e possivelmente único. Mas nem ao mar nem à terra, o mundo continuou girando e os jovens também, em sua tarefa exaustiva e infinita de buscar um mundo melhor e construir novas utopias. Com um legado importante graças a esta geração Woodstock, a grande maioria de nossos jovens não necessita enfrentar discriminações por raças, religiões ou preferências sexuais e seguem buscando em seus laços de amizade, um certo amparo diante de suas incertezas ou sofrimento. Quanto às medidas de seus prazeres e deveres, desde que estas passaram a ser responsabilidade de cada um, serão sempre trabalhosas e arduamente construídas ao longo de suas vidas. No plano político, foi com o slogan “ um outro mundo é possível” que o Brasil acolheu-os vindos do mundo todo para participarem dos Fóruns Sociais Mundiais que aconteceram a partir de 2001 em Porto Alegre, quem sabe acreditando serem capazes de transformar e reconstruir o mundo. Exemplo? A Folha On-line exibia dia destes, a foto de várias pizzas cujos desenhos da cobertura lembravam o bigode de Sarney, e que seriam distribuídas na abertura da exposição de escândalos da política nacional do Museu da Corrupção (www.dcomercio.com.br/muco/home.htm) realizada na faculdade de Direito São Francisco.
coluna do dia 19 de agosto de 2009
coluna do dia 19 de agosto de 2009
quarta-feira, 12 de agosto de 2009
Samba de muitas notas
Confesso não me lembrar das disciplinas teóricas (história da música, por exemplo) que faziam parte do aprendizado musical oferecido pelo Conservatório Musical de Araraquara, local em que estudei piano por muitos anos, mas a música, em toda a sua extensão sensorial, teve um peso substancial nas diversas etapas de minha vida. Assim como certos cheiros e sabores, os sons de nossa infância podem ser verdadeiras coreografias das lembranças que nos são significativas. Cenas de minha mãe tocando Chopin, assobiando os sambas cantados por Francisco Alves, ou de meu pai dançando ao som dos mais variados “long-plays” que tocavam na linda rádio-vitrola de nossa sala são apenas indícios de que ambos, por canais diferentes, imprimiram uma cultura musical em nossa família e, de certa forma contribuíram para que seus sete filhos( e a maioria de seus netos) se tornassem amantes incondicionais da “boa” música. Ao lado disso, a partir das décadas de sessenta e setenta, a singular conjuntura sócio-econômica-cultural do ocidente possibilitou o aparecimento de várias expressões juvenis nascidas no anseio de transformação da sociedade, e impôs uma importante mudança no panorama musical mundial.Tal como o boom da literatura nos dois séculos anteriores, a música transformou-se em porta-voz oficial das insatisfações, dúvidas, desejos e apostas dos jovens. Em um não tão lento e bastante perceptível movimento, ela foi ganhando um espaço inédito na vida dos jovens, auxiliado também pela velocidade e pelas facilidades com que o mercado passou a divulgá-las ( discos, TV, shows, festivais). Nasce assim, uma forma contemporânea de grande alcance desta influencia musical, um convite a muitos jovens, que daí em diante, começam a desejar a aprender a tocar piano, violão, guitarra, percussão, ou a formarem duplas, conjuntos e bandas que pudessem reproduzir os sons e as letras de suas preferências. Esta explosão cultural da música teve uma repercussão importante no Brasil, que ao lado da invasão dos diferentes estilos de rock,começa a movimentar um caldo cultural imenso e próprio de nosso país. Nestas mesmas décadas, os LPs ou compactos que tocavam em nossas vitrolas portáteis podiam ser os últimos lançamentos dos ícones da então promissora Bossa Nova (aquele som de samba eclipsado pelas batidas sincopadas do violão, com letras de um romance mais moderno, menos trágico) ou de Elvis Presley, Beatles, Rolling Stones, Bob Dylan, assim como de qualquer “ música pop” que emplacasse um sucesso. Além disso, a nova cultura musical chegava com uma proposição inusitada de movimentos corporais, um dançar em que os corpos acompanhavam livremente os sons, entregues aos compassos da música. A vida da maioria dos jovens passa a se entrelaçar com estas músicas, suas letras, suas melodias, seus ritmos. No Brasil, pudemos assistir aos poucos, um mergulho em nossas raízes musicais, e do samba, do choro, do baião, do forró, das músicas de viola, surgiu uma pluralidade de estilos novos, que conversavam com o erudito, o jazz, o rock e o pop internacional, mas também com o folclore e os mais variados gêneros regionais. Na voz e na caneta de muitos brasileiros ( Tom, Vinícius, Chico, Caetano, Milton, Gil, Hermeto são apenas alguns), nossa música foi ganhando um status internacional importante, mas também um reconhecimento de muitos jovens, que passaram a se interessar pelo seu acervo rico e variado. Foi uma surpresa agradável, por exemplo, ouvir no domingo último, em Araraquara, a mistura de rock e samba que o conjunto Sambô de Ribeirão Preto imprimiu em seu repertório. Quem poderia imaginar que um dia dançaríamos ao som de um legítimo ( e muito bom) samba de roda, com cavaquinho, pandeiro e rebolo, cantando "I Fell good", de James Brown?
coluna do dia 12 de agosto de 2009
coluna do dia 12 de agosto de 2009
terça-feira, 4 de agosto de 2009
À Deriva
Em geral a expressão “à deriva” nos remete a situações em que certas embarcações marítimas se vêem obrigadas por algum motivo a interromperem seu curso e a ficarem sem rumo, mas também cabe aos que propositalmente desligam seus motores e se deixam ficar algum tempo ao compasso do mar. No filme brasileiro que leva este nome e que acaba de entrar em cartaz na capital,as primeiras imagens que vemos são os corpos de uma menina de 14 anos e de seu pai, boiando,totalmente entregues ao balanço das ondas. Ficar assim à deriva, no mar azul, sem saber direito quando as ondas vão chegar e se deixar levar para cima e para baixo, olhos fixos na imensidão do céu, ouvidos submersos e atentos aos sons abafados pela água, pode ser uma experiência de muito prazer para alguns, mas acima de tudo é, sem dúvida, uma experiência de entrega, de se deixar levar e exige por isso,um mínimo de confiança. Esta cena, que também encerra o filme, parece ser utilizada pelo diretor para anunciar a delicadeza com que ele irá tratar do tema a ser explorado, tão caro para nós modernos. Filipa, a menina que acompanha o pai nas águas do mar de Búzios, é a mais velha de uma família de três filhos e naquele momento ainda não foi assaltada pelos sentimentos difíceis que todos os filhos vivem quando seus pais estão prestes a se separar. As separações, que na atualidade já fazem parte de um repertório comum a muitas famílias, são sempre mal vistas por todos, inclusive pelos próprios protagonistas, que em geral prorrogam esta decisão, titubeiam ou tentam diferentes maneiras de “salvar” a relação. As razões deste mal estar em torno da ruptura de um casamento não são tão óbvias e nem tão simples como se quer acreditar, mas com certeza nos mostram o quanto apostamos na construção de uma família estável, quando imaginamos a felicidade de nossos filhos. Felicidade esta que se tornou um item de máxima importância para a realização pessoal de todos, mas que é desde sempre, paradoxal. Há pouco tempo a Folha de São Paulo anunciou um enxame de livros acadêmicos americanos, frutos de pesquisas recentes em torno do que seria a felicidade para nós, contemporâneos: saúde, prosperidade, juventude? Sentir-se bem, desfrutar da vida e desejar que essa sensação se mantenha? As respostas são controversas e embora mostrem a felicidade como um fenômeno histórico, ou seja, dependente dos valores e crenças que elegemos a cada época, o fato destas pesquisas existirem mostra o quanto ela permanece sendo um de nossos mais importantes ideais, algo que imaginamos perseguir, mesmo que durante nossas vidas, elejamos diferentes objetivos como fontes desta felicidade. Mas para os que elegeram ser pais, a felicidade de seus filhos é geralmente parte integrante de sua própria felicidade e isso em geral se deve ao fato de que se aposta que eles poderão viver ( ter, fazer, realizar) o que não pudemos. Neste sentido as separações são sempre um saco sem fundo, em que não só pressentimos que os nossos pimpolhos irão sofrer, como nos angustiamos por não poder antecipar o quanto tais dores irão calar para sempre a possibilidade de eles poderem ser felizes. Por isso o filme em questão agrada a todos, mesmo que pareça ( ou justamente por esta razão) estar abordando temas tão banais. Agrada porque o clima tenso e inquietante de uma relação conjugal em crise, é mostrado pelo olhar de Filipa, a adolescente que precisará trocar a imagem idealizada de seus pais, pela crueza de suas realidades, vivendo na própria pele, os dramas que o amor e o sexo impõe a todos. Tal como um ritual de passagem, a menina tenta entender a mulher, ajustar seu olhar sobre os homens, às custas do desmoronamento de suas certezas infantis e de muitas lágrimas. Mas ainda assim, será possível a ela voltar a ficar à deriva com o pai ao seu lado, no mesmo mar azul de sua infância.
coluna do dia 5 de agosto de 2009
coluna do dia 5 de agosto de 2009
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