segunda-feira, 11 de julho de 2011

Passagens

Ao visitar recentemente uma exposição no Pateo do Collegio (centro de São Paulo) aproveitei para rever o museu que abriga a igreja e o antigo colégio fundado pelos jesuítas que deram origem a esta que é hoje uma das mais importantes metrópoles do mundo. Dois fatos paralelos me chamaram a atenção. Em uma das salas era possível conferir a importância da era das navegações (séculos XV e XVI) para a história do conhecimento humano, um marco na visão que o homem tinha de si e do mundo, obrigando-o a rever suas hipóteses de centro do universo e ampliando o espectro geográfico em que vivia. Na sala vizinha, a história do movimento jesuíta encabeçado pelo espanhol Inácio de Loyola também apontava para uma inovação dentro de uma Igreja Católica que tentava se equilibrar nas águas renascentistas corrompidas pelo poder. Ao fundar uma Companhia (formada inicialmente por ele e mais seis colegas) voltada exclusivamente para a ação apostólica, ou seja, para levar a “palavra” de Jesus a todos os habitantes da Terra, eles se dividiram pelos diferentes territórios tanto do mundo já habitado quanto dos novos mundos descobertos fincando igrejas e colégios. Sabemos como a história do descobrimento do Brasil se mistura a um movimento de catequese de nossos índios, considerados selvagens- excluídos da escala humana- e, portanto pecadores – suas almas precisavam ser transformadas para que eles pudessem fazer parte da cultura (européia) de então. Corte. Daqui a alguns dias se inicia a nona edição da FLIP – Feira Internacional de Literatura de Paraty e seu homenageado será Oswald de Andrade, poeta que viveu intensamente o movimento de ruptura modernista no Brasil e cunhou o conceito de antropofagia cultural, processo pelo qual os brasileiros devorariam e assimilariam a cultura estrangeira para criar e fortalecer a sua própria, um molde da identidade cultural brasileira com sua multiplicidade de nações indígenas e africanas. A atualidade e universalidade de seu "Manifesto antropófago" de 1928, serão temas de debates neste evento. Irreverente e inovador, Oswald não viveu para ser reconhecido, mas polemizado. Performático, muito além de seu tempo, seus escritos, suas aparições públicas, seus casamentos com mulheres ousadas, inteligentes e poderosas (Tarsila do Amaral, Pagu) causavam ao mesmo tempo frisson e constrangimento no ambiente modernista da época. Sua influencia na produção cultural brasileira contemporânea continua viva. Corte. Está em cartaz no MASP – Museu de Arte de São Paulo- até o dia 10 de julho, a exposição "6 Bilhões de Outros" um projeto audacioso do fotógrafo francês Yann Arthus-Bertrand que reúne até o momento 5 mil depoimentos -captados em 75 diferentes países- de pessoas comuns, homens e mulheres com opções religiosas, classes sociais, profissões, etnias e estilos de vida diferentes que respondem a questões simples sobre suas lembranças de criança, seus sonhos e projetos futuros. São 40 questões relacionadas à vida, a morte, ao amor, a felicidade, também aos medos e sofrimentos, ou seja, ao sentido que cada um dá à vida. Na mostra, as respostas estão reunidas em um grande mosaico de projeções em que os rostos dos entrevistados se alternam e parecem conversar diretamente com os expectadores, o que cria um laço de intimidade e identificação humana. Do pescador brasileiro a advogada australiana, da artista alemã ao agricultor afegão, todos respondem às mesmas perguntas possibilitando a quem assiste uma confrontação com a diversidade, com as divergências e com o que temos em comum, de forma muitas vezes surpreendente. Foi esta surpresa que levou o fotógrafo a pensar este projeto. Famoso por suas fotos aéreas há poucos anos atrás seu helicóptero sofreu uma pane que o obrigou a parar em uma aldeia de Mali. Recebido por uma família local, passou horas conversando sobre o que seriam as coisas mais importantes da vida. Tal e qual uma visão aérea de nossa diminuta importância na geografia universal e de nossa necessária irmandade na luta pela sobrevivência e pela vida em comum, ele quis saber mais sobre nós, homens e mulheres, que parecemos - nos recantos de nossas almas - desejar as mesmas coisas. Momentos diferentes de nossa história humana em que pressionamos estreitas passagens a fim de expandir nosso conhecimento, sobre o mundo, sobre outras culturas, sobre nós mesmos.

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