sábado, 13 de agosto de 2011

Quanto custa viver?

Sob diferentes temas repete-se na mídia um coro em torno do temor de um mundo sem “governo”, ou melhor, sem sujeitos preparados para manter a existência desta nossa civilização de terráqueos. Diante da percepção da instabilidade de governos, partidos e mesmo da precariedade do antes vigoroso mercado econômico, resta um olhar expectante ao nosso universo “humano”. Quem seremos? Como viveremos? Muitos se debruçam sobre as novas gerações e, diante de um exército de jovens hightecnologicamente mais preparados, constatam horrorizados seu despreparo no quesito “custos” do viver. Seriam mimados à espera de um mundo que lhes acene com bonificações e boas surpresas. Não parecem dispostos a pagar qualquer “quantia” em pró de um funcionamento mais justo e saudável da sociedade. De outro lado, impregnados ainda por uma moral do sacrifício, herança de nossa tradição judaico-cristã, para nós, geração dos mais velhos, é difícil imaginar um mundo humano em que Deus, adultos, professores e pais não sejam mais os fiadores nem os únicos detentores das normas do viver. Esquecemos que criticamos nossos pais pela rigidez de seus valores ou pelo culto hipócrita a uma moralidade de aparência que insistia em ocultar as contradições, o sexo, as fragilidades e as maledicências. Apostamos em nossos filhos- pequenos príncipes - e sentimo-nos livres para nos incumbir de uma missão gloriosa ao oferecer-lhes felicidade, liberdade e o melhor da vida em troca de uma boa dose de orgulho ao constatar sua dependência amorosa, seus progressos, suas façanhas. Eles seriam tudo o que não pudéssemos ser ou conquistar. A verdade é que certos deslocamentos e mudanças de valores acontecem sorrateiras, ao largo de nossas possibilidades de apreensão. A ciência nos contemplou com saberes que substituíram nossas “magias” e superstições. Temos novas crenças e nossas ousadias passam a conter novas medidas. Sentimo-nos cada vez mais cidadãos do mundo e menos enraizados em nossas culturas locais. A felicidade, por exemplo, não é mais algo que estaria negado a priori graças à nossa dívida eterna com um Deus que nos concedeu a vida. Ela estaria ao alcance de todos, é quase um direito. Torna-se difícil constatar que temos valores tão díspares entre as gerações o que talvez nos dê a impressão de que o “custo” do viver anda sem preços definidos. A percepção de uma “virada” moral escancara uma falsa possibilidade de viver grátis, sem que seja necessário pagar preço algum. No extremo oposto aos sacrifícios e renúncias esperados de todos para alcançar um “paraíso”, estariam as luzes e estrelas de nossa era tecnomidiática que acena com promessas de acesso imediato, sem dores ou custos. Como ajustar os preços? Quanto custa viver? Um livro recém lançado no Brasil e escrito por um jornalista americano – O preço de todas as coisas –  embora tenha um enfoque econômico, problematiza o modus vivendi atual em que nossas escolhas estariam pautadas pelo preço que acreditamos pagar por elas ao mostrar que a atribuição de preços é muito mais complexa (e fascinante) do que sugerem as máquinas calculadoras. Mostra, por exemplo, que o grátis, como princípio, não existe, mas que ficamos capturados na ilusão de conseguirmos algo de graça, estratégia fartamente utilizada pelas promoções. Enfatiza o lugar da cultura, que além de ajudar a estabelecer os custos numa sociedade, dá uma narrativa aos preços e termina apontando como a confiança nas instituições (graças a sua transparência), ao permitir  que uma população se identifique mais com seus pares, possibilita uma melhor fluência nas transações econômicas. A verdade é que a felicidade e a liberdade – sempre valores transitórios que dependem de inúmeras circunstâncias e época - parecem habitar compartimentos opostos à seara que comanda os “custos do viver”. Se nossa geração pagou um preço ao buscar uma vida mais justa  e mais prazerosa para todos , a geração atual ainda tateia o preço destas conquistas para estipular outros sobre o que aspiram viver ou vivem. Até porque tudo o que criamos como cultura só adquire sentido se puder ser compartilhado ou se despertar paixão em boa parte dos viventes, mesmo que tocado em outros tons. Mas tem sim o seu preço.

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