A verdade é que não faz muito tempo, tínhamos um
futuro muito grande à nossa frente, cheio de lugares que quase ninguém conhecia,
homens ainda em estágios primitivos de civilização, e uma enorme parcela da
população mundial apostando em um mundo melhor, em que se pudesse viver mais
feliz e tranquilo. Não por acaso, nas primeiras décadas da invenção do cinema,
os filmes apresentavam os duelos entre aqueles que buscavam um mundo mais justo
e esbanjavam valores dignos na caça dos que insistiam em seguir as próprias
leis, sempre em benefício próprio. Também os dramas amorosos seguiam a rota do
bom-mocismo e todos os desvios, fossem dos homens que não conseguissem renunciar
à suas vidas de playboys ou das mulheres que se divertiam em seduzir os casados
ou comprometidos, acabavam devidamente punidos (para o alívio dos
espectadores). No “the end”,eram os homens e as mulheres do bem que formavam os
casais que iriam viver felizes para sempre. Tempos bons, diriam muitos a
suspirar. Tempos em que era possível viver com a esperança de algum futuro promissor.
Tínhamos tanto a aprender! Mas quem sabe, porque tivéssemos um espectro
importante de algo a acontecer, podíamos nos abrigar em polarizações simplistas
sobre nós mesmos, dividindo-nos entre mocinhos e bandidos, cada um em seus
devidos lugares. À medida que as ideias de democracia, liberdade, justiça, direito
à crítica, tolerância ou solidariedade avançaram em paralelo com o progresso da
tecnociencias e a complexidade do mercado financeiro global, o mundo se tornou
mais difícil de ser compreendido. Nossa tarefa civilizatória parece ficar cada vez
mais exigente. Por outro lado, o mundo tornou-se nossa casa e se ninguém nos
avisa, nem nos lembramos de como chegamos até aqui. Não gostamos muito de
imaginar que a Terra é um planeta que pode desaparecer ou que como “homens” que
evoluímos até aqui, teríamos por obrigação pensar o futuro dessa humanidade.
Mas que futuro e para quê? O convite do aqui e agora é bastante sedutor, pena
ser o responsável por nos jogar inevitavelmente em uma lógica utilitária: vivo,
penso, faço somente o que acho que será útil para mim e os meus. Assim, também,
seguindo os mesmos critérios, é possível classificar o que é bom ou ruim, o que
é do bem ou do mal. E quanto mais superficiais nossas análises, mais amamos os
iguais e odiamos os diferentes, adoramos os que nos premiam com a satisfação de
nossas expectativas e detestamos os que não nos dão importância ou nos
frustram. Basta que o “tico e o teco”, nossos neurônios básicos, mantenham seu
funcionamento mínimo, não nos exijam muito esforço e nem excessiva perda de
tempo. Opa! Parece que mesmo que o mundo tenha ficado mais complexo,
continuamos a utilizar nossa lógica binária para dividir o mundo, os homens e
suas ações em bons e maus. Talvez esta seja uma das características mais
importantes de nossa humanidade. Não abrimos mão deste conforto. Queremos
ordenar o mundo, as coisas e as pessoas de modo a não ter que acionar nossos
medos, assombrações, inseguranças e incertezas. Quando classifico tudo com
minhas certezas não há porque me inquietar. Sou um homem comum, como todos os
homens bons.
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