domingo, 31 de agosto de 2014

Se ficar, comem; se correr, pegam.

Logo após as redes sociais divulgarem a morte do candidato à presidência da República Eduardo Campos, causando um choque generalizado pela forma trágica com que ocorrera, alguns internautas postaram um quadrinho em que os dizeres eram um pedido (irônico) de “basta” pelas mortes de pessoas públicas e queridas acontecidas nos últimos dois ou três meses. Tinha sido suficiente e que ninguém mais morresse! Não se poderia suportar. A cada morte anunciada destas pessoas públicas - que por este motivo nos parecem tão próximas e com as quais acompanhamos a trajetória por motivos os mais diversos – choveram manifestações pelas redes sociais, fosse para homenagear, discorrer sobre o pesar, compartilhar o sentimento de perda e de vazio ou ainda recuperar pela memória afetiva, os momentos em que aquela pessoa havia participado sem o saber, de algum ato transformador de suas vidas. Neste sentido, quando a rede de amigos é composta por aqueles que traduzem pela via de suas experiências, sentimentos e ideias com as quais cada um se identifica, alguns textos pessoais podem ser verdadeiros bálsamos por oferecer palavras que acomodam ou exaltam nossas emoções. De qualquer forma, compartilhar em rede a experiência da perda de alguém e que normalmente suscita sentimentos tão ímpares a cada um é algo novo, e pode expandir as possibilidades de narrativas dos acontecimentos cotidianos e contribuir, muitas vezes, para fazer circular e acrescentar ideias que modificam a visão que temos do mundo e das pessoas. O contrário é também verdadeiro. Por ser um espaço democrático e livre, o uso das redes pode ficar a serviço de elucubrações bizarras, desconexas e superficiais ou para se despejar, sem críticas ou critérios que levem em conta o impacto do “receptor”, sentimentos de desprezo, denúncias difamatórias, palavras que indiquem  preconceitos de alguma ordem. Nada que já não exista no quadro de possibilidades de convívios humanos, mas com certeza, o fato da rede não exigir o olho-no-olho, nem a presença física, favorece aqueles que talvez titubeassem em expor sua hostilidade ao vivo e a cores. O que se pode chamar de constrangimento social, lubrificante importante da manutenção dos “bons costumes”. Também é verdade que o acesso democrático sempre pode estabelecer trocas, ainda que sejam para discordar de X ou Y argumentos, ou pedir uma reparação pelo uso indevido ou equivocado de palavras agressivas, o que nem sempre é algo que mereça ser evitado. É muitas vezes no confronto das ideias que se pode avançar em busca de novos conhecimentos e interpretações. Não, não estou apostando que possamos passar a ser melhores pessoas graças a esta engenhosa invenção da comunicação humana. Também não estou ingenuamente fazendo uma apologia de um futuro promissor alavancado pelo uso de redes sociais. Apenas indicando um outro olhar, ao analisar as “criações” humanas à luz de sua necessidade permanente de compreensão ou quem sabe defendendo de forma vigorosa, que todos temos (se quisermos) a possibilidade de pensar sobre a viabilidade da emancipação humana. Seja no conforto ou bem longe dele.

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