quarta-feira, 15 de julho de 2009

De mãe para filhos

As primeiras cenas do filme francês Horas de Verão (em cartaz na capital), mostram a comemoração dos 75 anos de Hélène, junto a seus filhos e netos, na casa de campo em que reside próximo a Paris, em companhia de uma antiga empregada e uma infinidade de móveis e objetos de arte de grande valor. Enquanto as crianças e adolescentes brincam e se perdem pelos campos ensolarados, os três filhos ( dois homens e uma mulher) e as duas noras sentam-se em volta da matriarca no jardim. As conversas tentam cobrir o tempo de ausência de Adrienne (que mora em Nova York) e Jérémie, o caçula, que reside com a mulher e seus dois filhos na China. Frédéric, esposa e dois filhos são os únicos que moram na França. Quanto a Hélène,a mãe, sua fala e olhares antecipam seu sentimento de que o fim está próximo, o que a leva a partilhar com o filho mais velho suas sugestões em relação ao legado artístico e de grande valor que a casa contém. Embora o filme seja muito simples e singelo no modo como irá mostrar a morte da mãe e as negociações que se seguirão entre os três filhos para decidirem o futuro da casa e do acervo artístico que ela possui, há nas entrelinhas, uma tentativa de discussão e reflexão sobre as heranças familiares, sejam elas materiais ou afetivas, diante de uma nova maneira de se estar e viver no mundo. Ao contrário do que se poderia imaginar, Hélène pede à Frédéric que vendam os quadros e os objetos de arte, que por valerem muito, poderiam ser mais úteis a eles, assim como a casa e seus móveis assinados. Frédéric não suporta imaginar a morte da mãe e muito menos a desaparição da casa de sua infância e seus objetos tão investidos de sua história familiar. Não é o que pensam seus dois irmãos que residem fora da França. Sabemos como cada filho, ao nascer, recebe um lugar dentro da família, antecipado pelo imaginário de seus pais que já sonham com seu nome e seu futuro. Mas cada criança tem sua história individual, para além de suas origens familiares e sociais, e caberá a cada um, substituir a imagem idealizada dos pais da infância, dos sabores, cheiros e ruídos deste lugar de proteção, permitindo que a família deixe de ser sua única fonte de referência. Frédéric se surpreende e sofre com a decisão dos irmãos pela venda total do patrimônio familiar, mas precisa se render ao fato de ser voz vencida. Ele se vê confrontado com a necessidade não só de renegociar com o que imaginava ser sua filiação na família, mas com seus sonhos de manter esta memória viva. Há uma exigência do mundo atual no destino de cada filho, que a primeira vista parece paradoxal. As famílias precisam cuidar e proteger seus filhos, mas precisam também deixá-los seguir suas vidas, cumprindo assim um papel ao mesmo tempo de tradição e de transformação. E, embora os sinos da tradição muitas vezes toquem alto demais e confundam o valor do novo e do velho, este filme mostra como é possível negociar as medidas destes dois importantes itens na vida de todos, quando há espaço para a coerência ( e não arbitrariedades) e respeito pelas diferenças.

coluna do dia 14 de julho de 2009

Nenhum comentário:

Postar um comentário