quarta-feira, 1 de julho de 2009

Valquírias

O filme que trouxe Tom Cruise ao Brasil em turnê de divulgação estreou neste final de semana na capital. Baseado em fatos reais, o título refere-se à Operação Valquíria, espécie de senha para que o exército reserva nazista entrasse em operação, caso acontecesse qualquer inquietação interna que ameaçasse ao partido ou a Hitler. É fato sabido que Hitler reverenciava o compositor alemão Wagner, anti-semita confesso e autor entre outras grandes obras, da ópera Valquíria. O nome desta operação guardava, portanto um valor de sustentação da posição do Führer, mas será re-utilizado por um grupo de militares para armar um golpe em que ele e sua alta cúpula seriam assassinados no intuito de devolver a dignidade e a ética ao exército alemão e à própria Alemanha. O filme começa com o coronel Stauffenberg, personagem de Tom Cruise, em meio aos ataques dos aliados, registrando em seu diário de guerra sua revolta sobre os rumos e os crimes da empreitada nazista, e a premência dos militares em planejarem este basta. Outro filme em cartaz na capital, O Leitor, mostra o julgamento de um time de mulheres trabalhadoras alemãs,condenadas por compactuarem com os crimes nazistas ocorridos dentro dos campos de concentração. Ambos os filmes encenam tímidas tentativas de dividir com o mundo, a radiografia da cumplicidade dos alemães com as atrocidades contra a humanidade cometidas na era nazista. Quando os militares envolvidos com a Operação Valquíria percebem que seu plano havia sido frustrado, alguns se suicidam e outros morrem fuzilados em meio a bravas palavras de urras a uma Alemanha livre. O tom do filme tenta ressaltar a dissidência e por isso,a preocupação destes alemães, em serem lembrados por discordarem das ações de seu chefe supremo. Mais intimista, O Leitor nos mostra com delicadeza a complexidade da alma humana e faz deste filme ( que recebeu 5 indicações ao Oscar) uma espécie de reflexão apurada sobre os caminhos da xenofobia, esta intolerância humana ao estranho e ao diferente, que geralmente justifica os piores momentos de nossa história . É assim que de tempos em tempos, vemos surgir no cenário global, movimentos coletivos de rejeições ao diferente, em geral alimentados por estratégias políticas que visam naquele momento, culpabilizar certos setores da sociedade como ameaçadores. Notícias daqui e dali sobre vítimas de grupos neo nazistas em diferentes partes do planeta nos parecem bizarras. Na Europa cresce o temor de que a concorrência de fora represente uma ameaça, e o imigrante se transforma em bode expiatório alimentando a idéia de que a classe média necessita se proteger. Perplexos, ouvimos tocar novamente o velho refrão da música da intolerância humana, insuflando os conflitos e as diferenças. Foi após décadas de sua morte que Richard Wagner, conhecido em seu tempo por manifestar-se contra os judeus, tornou-se o músico preferido de Hitler. Mesmo sendo reconhecidamente um gênio da música, que revolucionou a concepção de ópera, sua obra está proibida de ser executada em Israel, que acredita não ser possível admirar sua obra, dissociando-a de sua aversão ao povo judeu. A ópera Valquíria baseia-se na mitologia nórdica em que as valquírias seriam deusas da guerra prontas a resgatar os guerreiros mortos e transformá-los em heróis. Aos poucos as valquírias passaram a representar o lado obscuro da alma humana, capaz de odiar o estranho, tão familiar a cada um. De um lado a outro, ambos os filmes nos lembram que a história humana vive e revive períodos em que nos juntamos no intuito de avançar na conquista de nossa liberdade de pensamento e de respeito às nossas diferenças e outros em que as luzes se apagam e atribuímos aos nossos semelhantes- diferentes, a justificativa de nossos medos e nossa hostilidade.

coluna do dia 17 de fevereiro de 2009

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