sexta-feira, 6 de março de 2020


Avós, mães/pais, crianças - a transmissão dos cuidados.

                                                                 Gisela Haddad

Preâmbulos

Na ocasião em que este texto foi pensado, a ideia era privilegiar a transmissão da maternidade utilizando-se da tríade avós, mães, meninas, mas no decorrer de sua escrita, questões socioculturais que gravitam em torno do nascimento e da criação de bebês foram se impondo, assim como a convivência e a troca de experiências com amiga(o)s que se tornavam avós  ampliou  e acrescentou interrogações sobre essa temática. Também eu me tornei avó pela primeira vez no ano de 2014 e no período  em que meu neto foi gestado e nasceu, vi-me invadida por um turbilhão de sentimentos nem sempre passíveis de elaboração. O texto a seguir pretende refletir e problematizar a função de avós na cena contemporânea, colocando-a lado a lado com as funções paterna e materna, para pensar de forma ampliada a transmissão da parentalidade, e o lugar ocupado pelos “cuidadores” que sem serem diretamente protagonistas ou beneficiários do que a criança ou o jovem vive, são convocados a se colocar em uma retaguarda atenta, entre a liberdade e a vigilância, para encarar uma das maiores experiências de vida.

Esse mundo

Há apenas algumas décadas, as mudanças em valores sociopolíticos, culturais e morais que organizavam a sociedade costumavam cumprir um prazo que permitia às novas gerações assimila-los e contrasta-los com aqueles transmitidos pelas gerações anteriores. O que se convencionou chamar de pós-modernidade, ao contrário, caracteriza-se não só por uma desconstrução às vezes radical de antigas crenças e modos de existência, mas por uma velocidade jamais vista.  Tal panorama inusitado e muito mais complexo tem instado pensadores de áreas diversas a tentar capturar o Zeitgeist ou espírito da época, buscando elementos que contextualizem e articulem estas transformações com as aspirações e as angústias próprias deste momento. Freud (1930) afirmava que produzimos cultura na esperança de nos proteger dos perigos reais e imaginários, mas sempre permanece um resto que marca o limite da criação humana em sua tentativa de suprimir o mal-estar inerente ao humano. Se há um movimento civilizatório incessante de produção de normas e compensações que visam conciliar o sujeito com a cultura, é necessário, embora difícil, avaliar os efeitos da complexidade de um mundo que oferece tantas facilidades tecnológicas, acesso imediato a quaisquer informações, inúmeras maneiras de cuidar e tratar da saúde, mais tempo para se inventar formas de lazer, liberdade para escolher pares, amigos, carreiras, estilos e vida sexual, produzindo maneiras inéditas de se viver e ser reconhecido como membro da irmandade humana. O deslocamento da ética repressiva para uma ética do direito ao gozo e à felicidade incita a abolição do sofrimento, a recusa de qualquer signo da falta e de imprevisibilidade, compactuados pela promessa do conhecimento científico, da possibilidade de gestão das competências e habilidades pessoais e da eliminação de transtornos ou correção de comportamentos desviantes, como acessíveis a todos. Como contraponto, a noção de risco (Giddens, 2000) invade o cotidiano de todos e impõe vigilância, controle e reparação permanentes em todos os aspectos da vida, seja nas formas de prazer ou nas experiências de mal-estar, o que desmonta a propalada autonomia do sujeito, muitas vezes celebrada como conquista, ao revelar a crescente dependência de discursos competentes, que ao invés de certezas produz uma angustiante e interminável errância.
Assim, entre as demandas de um ideal cultural prometeico, e o vazio e/ou excesso de referências legitimadas pelo social, pretende-se jogar luzes no cenário da família contemporânea, especialmente nas funções exercidas por aqueles que cuidam dos que nascem e se veem arremessados na tarefa de acolher e preparar os futuros cidadãos, oferecer meios para que se integrem na cultura e construam seus destinos como parte de uma coletividade maior. Talvez uma das tarefas mais importantes deste novo século.

Uma nova família para a psicanálise

Sim, a família, um dos conceitos pilares da teoria psicanalítica sofreu inúmeras transformações e o naufrágio do modelo da família nuclear analisado por Freud questionou radicalmente certas naturalizações legitimadas pela cultura da época. Ao relativizar a diferença biológica dos sexos e ressaltar as identidades sexuais ou gêneros, a cultura atual questionou a classificação binária (homens e mulheres) e multiplicou as diferenças sociais e identitárias. Impôs-se uma simetria inédita e o respeito às singularidades entre os gêneros o que contribuiu para mudanças radicais na maneira como se vive a sexualidade e se formam os pares conjugais, que, além de elegerem o amor como eixo de suas escolhas, ao contrário da estabilidade formalizada a priori nos antigos casamentos, baseia-se em pactos entre os cônjuges, que dependem exclusivamente da lealdade e do comprometimento mútuo. É nestes pactos que alguns poderão  compartilhar uma busca de metas em longo prazo que implique um adiamento de satisfações em troca de um futuro. Uma destas metas pode ser o projeto de criação de um filho, um projeto, portanto, longe de ser uma decorrência “natural” da vida de todos ou de assegurar a perpetuação dos mesmos agentes cuidadores. 
Por seu lado o nascimento de um novo bebê, além de um fato físico, social e político, é também um fato psíquico (Ceccarelli, 2007) que pressupõe que alguém lhe antecipou um lugar e que será investido para que possa ser reconhecido como parte de uma organização social ao receber as heranças da cultura a fim de se tornar um sujeito. Tanto o fato físico quanto o social são meros acordos, não pressupõe que os pais sejam biológicos e sim que reconheçam a criança como filho e se encarreguem de seus cuidados. Ao perder sua importância social na constituição da parentalidade, a consanguinidade vem dando lugar a um critério considerado crucial pela psicanálise: todas as crianças ao nascer precisam ser adotadas por seus cuidadores, sejam elas ou não filhas biológicas. E este “adotar” é um processo quase sem fim. Ser pai ou mãe, ou exercer uma função de parentalidade depende principalmente de um comprometimento. A "função materna" e "paterna”, tão caras à psicanálise, são funções e operações constituintes do sujeito que podem ser sustentados por diferentes agentes dispostos a oferecer cuidados e responsabilidade com o desenvolvimento físico e psíquico do bebê e com sua inserção na cultura. O bebê humano depende deste investimento e comprometimento para sobreviver física e psiquicamente, e para tornar possível a  transmissão do patrimônio cultural simbólico que lhe permita ser inserido e reconhecido por seus pares e, quiçá, construir novos discursos para estas mesmas funções parentais com novas referências simbólicas.
Se a família não se define mais pelos laços de sangue, os de filiação tampouco já estão dados. Há que se construir a filiação, um trabalho psíquico, feito um a um, rumo ao quem sou eu, a qual espaço pertenço e me reconheço, ao meu passado e ao meu presente. Um processo de filiação que deverá marcar não só uma continuidade entre as gerações, mas a diferença entre estas.
A despeito de se constituir como monoparental, com pares homo ou heterossexuais, abrigar padrastos, madrastas ou irmãos postiços, o que define uma “família”, além da presença implicada de agente(s) cuidador(es) é que esta possa cumprir a exigência de abrigar ao menos duas gerações e fazer circular as normas que impedem o uso e abuso do corpo da criança. O pacto narcisista (Aulagnier 1979) é um contrato inconsciente que se refere ao lugar oferecido pelos pais para seu bebê e a carga que este deverá assumir. Por seu lado o bebê é ativo desde o nascimento, com competências e capacidades para interagir com seu entorno, discriminar características de seus cuidadores, estabelecer ligações afetivas e até modular o tipo de interação no qual se encontra. O bebê do século XXI não está centrado sobre si mesmo, ao contrário, engaja-se em trocas emocionais significativas com seus cuidadores (Zornig 2010). E, como herdeiro dos pactos selados pelo grupo familiar atravessado pela cultura, inclusive aqueles não revelados, cada novo bebê contribui na tarefa de assegurar a continuidade de seu grupo familiar e co-construir uma conciliação possível entre a história passada e a sua. Este é o vão do acesso ao processo de subjetivação que pressupõe que a singularidade seja respeitada numa relação de alteridade.

Na cena familiar

A gestação, o nascimento e o desenvolvimento físico e psíquico do bebê vêm ganhando espaço e atenção de todas as instituições sociais, mantendo-se como foco constante de produção de saberes múltiplos que se dirigem ao acolhimento das necessidades do bebê e de seu futuro. Ao colocar a criança e a infância no centro das preocupações presentes e futuras, modelos normatizados e idealizados destas funções são criados, na expectativa de que os pais ou cuidadores possam vir a ser “especialistas”. O discurso prometeico da cultura apresenta a gestação e a maternagem como um campo que pode ser experimentado sem grandes percalços ao oferecer uma infinidade de informações, cartilhas, serviços e profissionais cada vez mais especializados. O advento das redes sociais fez proliferar blogs com depoimentos e testemunhos de futuros ou atuais mães e pais com dicas que vão desde a infinidade de objetos considerados imprescindíveis à tarefa dos primeiros cuidados, até temas mais viscerais como o sono do bebê, o choro, a amamentação, o uso da chupeta, o banho, as dores de barriga, onde dormir, como e quando tomá-lo no colo, na expectativa de responder às angústias e incertezas que assombram aqueles que inauguram sua função de pais. Instalou-se um ethos terapêutico para a família e uma disciplinarização das funções do grupo familiar: engravidar ou não, como e quando engravidar, o que fazer quando não se consegue engravidar, como ser um bom pai, como ser uma boa mãe. À benvinda crítica que se faz para com a sideração que tal aparato promove, no sentido de disciplinar as funções parentais, acresce-se o fato de que a produção de saberes dos especialistas (médicos, psicólogos, educadores, enfermeiros, etc.), embora competente, mais confunde do que tranquiliza, levando os futuros pais ou cuidadores a se sentirem desautorizados a fazer suas escolhas que podem não ser reconhecidas como as melhores. No entanto, ainda que estes saberes prometam (mas dificilmente cumpram) poupar o trabalho de se relacionar com o mal estar e os equívocos que gravitam em torno do tornarem-se pais ou de evitar grandes sofrimentos, tal multiplicidade de discursos produzidos para responder às diferentes possibilidades de adesão aos caminhos desta empreitada, revela a preocupação, jamais vista na história humana, de todas as instituições da cultura em relação à infância. De certa forma, os atores parentais passam a ser coadjuvantes, chamados a cumprir a cartilha biotecnomédica, e o ator principal, o bebê, submetido a leis mais ligadas ao mercado do que à saúde. A produção de um vácuo para o exercício destas funções pode ser atestada pelo fato inédito e que merece reflexão, da utilização das redes sociais pela geração atual de futuros ou recém-pais e mesmo de cuidadores “terceirizados” (avós, madrastas e padrastos, parentes, etc.), responsáveis por compor um imenso “livro” de testemunhos digitais e de fácil acesso em que são compartilhadas dicas, sugestões, textos de especialistas, mas principalmente dúvidas, mal estares e aflições que de certa forma fazem parte do cotidiano desta ampla comunidade. Desta, a grande porcentagem é de mulheres, que por viverem em um mundo que oferece alternativas ao seu papel antes principal de mães naturais, convivem com um discurso social que continua privilegiando-as para os cuidados com os bebês, mas obriga-as a responder demandas contraditórias na gestão de sua vida pública e privada.
Por seu lado, a clínica psicanalítica ampliou significativamente seus saberes sobre a gestação e os dois primeiros anos de vida de um bebê, e pela voz de seus profissionais aponta para o fato de que, apesar da busca muitas vezes promissora de preparação feita pelas novas gerações, invariavelmente o bebê real desconstrói o modelo ideal que se tentou montar. Não há como evitar a surpresa, a estranheza e o enigmático que ronda esta passagem de um ser que demanda cuidados de todas as ordens e que precisará, graças a estes cuidados, ser adotado pelos pais e pela cultura. Uma adoção que mais do que um saber ativo, demanda uma disponibilidade psíquica. Também colocou luzes na questão da presença, da ausência e da influência de um sujeito sobre outro (a identificação), das angústias de intrusão ou de abandono do bebê, dos que cuidam e que não podem ou não conseguem exercer seu papel de refletir ao bebê quem é ele ou servirem-lhe de intérpretes do mundo, e de alternativas para tais situações. Em um plano ideal, espera-se que aqueles que cuidam possam assumir as funções de sustentar, conter, reconhecer, espelhar, interpelar e convocar para que a criança possa construir uma referência para si mesma, tornando-se ela mesma capaz de vivenciar e dar nome às suas próprias emoções. Como balizas, estas premissas estão longe de serem efetivadas pelos cuidadores, mas Roussillon (2012), afirma que em cada cem, quase sessenta das primeiras interações entre os protagonistas - cuidador e bebê - são interações de ajuste, ou seja, cumprem com as etapas consideradas importantes para o advir de um sujeito.

Antes e depois: maternidade, paternidade, infância.

A modernidade promoveu a naturalização de conceitos e práticas relacionadas à maternidade e aos cuidados maternos, fazendo com que durante um longo período, a maternagem fosse pensada como intrinsecamente relacionada à maternidade e definida como função feminina por excelência; concernente à natureza da mulher. A partir do século XVIII, o discurso  filosófico, médico e político fomentou um outro mito: a  exaltação ao amor materno visto de forma incontestável como “instintivo” e “natural”. Os séculos XX e XXI dessacralizaram tais referências e desconstruíram os antigos protocolos de uma constituição familiar. A possibilidade de separar o sexo da maternidade balançou os velhos tabus ligados à imagem da mulher-mãe, e possibilitou às mulheres a conquista de liberdade e direitos inéditos. Convocadas a fazer escolhas em todas as áreas de suas vidas, privada e pública, os projetos de constituir uma parceria conjugal ou de ter filhos podem ou não fazer parte da grande lista que a maioria planeja realizar no curso de suas vidas. Como o destino das mulheres não se resume mais ao “se casar e ter filhos”, a decisão de gestar um filho, fato que ainda é bastante usual (não sabemos se continuará no próximo século) tem sido muitas vezes dividido com o parceiro(a) quando este(a) existe, formando o casal grávido, uma dupla que compartilha pari passu as escolhas exigidas para este processo, expostos que estão à grande parafernália de objetos e serviços que rondam este acontecimento. Mas se no discurso social atual sobre o feminino o lugar da mulher pode não coincidir com o de ser mãe, ou ser mãe pode se constituir como um desejo possível, ainda estamos longe de nos livrar da sobreposição “naturalizada” mulher-mãe. Os saberes da biomedicina acenam com a supervisão higienista sobre quaisquer dificuldades com a concepção, a gestação, o parto, a amamentação e os cuidados. Mas gestar um bebê dentro de si não se resume a emprestar um ventre por um tempo determinado. Ao mesmo tempo em que o embrião é contido no corpo, irrigado de cuidados e alimentos necessários ao processo de se tornar um bebê, no imaginário materno podem se desenhar cenas de encantamento e/ou de terror em relação a este querido e/ou estranho que a habita. A experiência da gestação nunca é sem consequências e suas marcas estão articuladas ao mundo interno de cada mulher. O psiquismo materno durante este processo é um psiquismo em crise, com maior permeabilidade, em que há um enfraquecimento das resistências, um sobre investimento da história pessoal e um retorno de vivências infantis, às vezes em um cenário caótico em que retornam antigas feridas narcísicas, traumas, lutos e herança geracional (Aragão, 2011). No plano psíquico, uma passagem necessária para que a filha que está se constituindo mãe, construa seu espaço materno e a representação do bebê em seu imaginário. Esta seria a transmissão da maternidade via relação mãe-filha. Campo complexo e passional, as fronteiras entre mãe e filha são construídas por um intenso trabalho psíquico, mas sempre parciais e sujeitas a desafios, voltando a ser refeitas em momento críticos como o tornar-se mãe pela primeira vez (Ribeiro, 2014). Podemos dizer que há ainda uma especificidade da experiência da maternidade em que cada mãe revisita sua relação com a própria mãe como parte do tornar-se mãe, uma transmissão geracional?
Por seu lado, à medida que o discurso feminista e o discurso homossexual romperam com os pressupostos do patriarcado (no qual o homem era visto e comparado à verdade absoluta e à perfeição e a mulher era subalterna e passiva), um novo modelo de relações igualitárias entre os sexos foi se delineando. O que se assiste é o nascimento de uma parcela da atual geração de homens convocados a mergulhar e participar desde o início do projeto de ter filhos. Muitos à vontade em exercer as tarefas antes exclusivas das mulheres. Mulheres e homens que aos poucos ampliam o saber sobre si e contribuem para modificar o discurso público que atribuía papéis específicos a cada gênero na tarefa do cuidar. Na abertura deste leque, homens e mulheres exercem a função materna e a função paterna, muitos optam por não ter filhos, assim como muitos, mesmo tendo escolhido trilhar este projeto, não se sentem constrangidos em avaliar sua escolha como equivocada. Ser pai ou mãe não é mais destino.
E a infância? Conceito construído historicamente é somente a partir do século XVII (Ariès, 1981) que as crianças ganham um novo estatuto, visando educá-las e prepará-las para se tornarem adultos bons e produtivos e assim assegurar o futuro da civilização. Ao passar a ser consideradas diferentes dos adultos, elas adquirem um valor novo e especial, o que graças ao culto à maternidade, irá desencadear transformações na organização social e na concepção da subjetividade humana. Aos poucos, o lugar que a criança passa a ocupar no narcisismo dos pais é o que dará suporte, na vida privada, ao investimento de desejo nos filhos, que passam a ser depositários dos ideais de sucesso. Considerado ainda como uma importante possibilidade de continuidade de suas vidas, muitos pais encarregam seus filhos de compensar seus fracassos com seu sucesso e sua felicidade. Ao se tornar preferencialmente uma tarefa amorosa, o exercício da função parental inaugura uma nova forma possível de convivência entre pais e filhos. Mais atenciosos, disponíveis e compreensivos, o imperativo de amá-las que decorre da necessidade narcísica de vê-las felizes, provoca não só angústia e culpa se o sentimento de seu amor lhes parecer insuficiente, como os enche de incertezas em relação ao seu papel de transmissor de valores e normas que regem a convivência, quando este exercício significa frustrá-los. Qualquer obstáculo real ou imaginário que se oponha ao ideal de felicidade imaginado para os rebentos causa desconforto quanto às direções das tarefas educativas ou a assunção da dessimetria da função parental. As decepções para ambos os lados são insuportáveis. Por outro lado, se o alto valor narcísico atribuído aos filhos cobra seu preço na expectativa de que estes sejam perfeitos e sem falhas, muitos ao ocupar este lugar de espelho narcísico e de produção de satisfação para os pais, ficam sem um lugar de verdade, aquele que cada um precisa buscar para si no mundo adulto, das leis e normas da sociedade em que vive. Vale questionar o amor e a devoção que dedicamos aos nossos bebês, atados que são à reparação de nossas dores narcísicas, assim como refletir sobre o ciclo repetitivo que parece se formar entre as gerações, em torno da promessa de reparação via o desejo de ter um filho. Que sujeitos serão estes?
Os avós
O aumento da expectativa de vida e a promessa da ciência em descobertas que prolonguem a qualidade de vida fez a velhice mudar de ares e de idade. Em plena “cultura do corpo”, a preocupação com o bem estar físico e a saúde é quase uma obrigação. Aqueles que outrora foram considerados idosos, hoje vivem mais e melhor e engordam a estatística dos que se tornam avós e vivem de 30 a 40 anos nesta função. Um panorama que altera a convivência dos avós com seus filhos e netos, inaugurando novas faces destes papéis, que ao contrário de antigamente não possuem formas ou delimitações, inclusive pela multiplicidade de formatos familiares. O nascimento de um neto é um acontecimento que impõe uma reorganização psíquica para os avós que ganham um novo lugar na escala geracional e precisam construir sua parentalidade de avós junto aos netos e ajustá-la com a dos filhos. Cada um vive sua experiência conforme sua história e seus projetos, em um processo que não está isento de tensões, e muitas vezes longe da imagem idealizada comumente propagada. O fato de a sociedade atual passar a esperar que seus idosos, ao invés de se recolher às suas casas, lutem contra as perdas físicas, psíquicas e sociais do envelhecimento pode fazer, por exemplo, com que a notícia de um futuro de avós nem sempre seja recebida com pulos de alegria, ao contrário, alguns podem resistir a encarar esta nova função que a princípio os condena definitivamente a caricatura da velhice associada à temida decadência física, à doença e à perda da autonomia, ou seja, fatores que os aproximam da ideia da finitude. Mas tal resistência costuma desaparecer com o nascimento do neto ou neta e a convocação deste lugar a ser ocupado. Sem muito acervo para referendar seus papeis de avós, alguns tentam compartilhar com seus pares os percalços e as alegrias desta experiência. Embora construam uma relação avós-netos diferente, esta em geral é principalmente uma relação privilegiada, que permite a alguns avós desenvolverem uma relação de suplência e transmissão posicionando-se para além das funções parentais. Além disso, a nova geração de netos pode criar interlocuções atraentes ou inusitadas para os mais velhos, inaugurando um tempo de trocas afetivas e de conhecimento que podem ser interessantes. Se a presença dos avós pode dar à criança este sentimento de continuidade da existência, os netos trazem notícias sobre um futuro, que às vezes lhes é desconhecido.

Tornar-se avós 

No prefácio do Livro dos avós: na casa dos avós é sempre domingo? (Arantagy; Posternak,2010) a terapeuta Lídia Aratangy relata a aflição de seu amigo e pediatra Leonardo Posternak , ao lhe fazer a pergunta: “Onde a gente aprende a ser avô? ”. Ele acabara de receber a notícia de que sua filha estava grávida e diante da falta de referências sobre esta nova função que já espreitava sua alma, havia feito uma busca nas livrarias atrás de algum manual sobre o tema. Nada. O livro parte deste vazio para tentar “compartilhar as dúvidas e iluminar as respostas”. De lá para cá alguns livros foram publicados e muitos blogs passaram a habitar as redes sociais em que avós relatam suas experiências no convívio com seus netos e netas. A palavra voternidade passou a ser divulgada para designar esta nova função. Na sinopse de Voternidade: ser avô, ser avó, a psicanalista Sonia Pires (2015) escreve que seu livro pretende discutir com os avós sobre as confusões, descaminhos e desencontros inevitáveis, próprios de quem caminha no escuro, experimentados pelos que tentam descobrir a melhor forma de estar na família sem abdicar das possibilidades e desafios oferecidos pelo mundo atual.
De fato,  refletir sobre as características de “tonar-se avós” em nossos tempos, não se resume às mudanças nos papéis da mulher, dos homens, das conjugalidades, das novas configurações das famílias, e das múltiplas opções para se viver inclusive este período tardio de suas vidas, mas principalmente ao lugar ocupado por esta nova função na escala geracional e sua importância na suplência da transmissão da ordem da cultura, ao fornecer significados, palavras, valores importantes para o infinito processo de um bebê se tornar sujeito e se transformar em um cidadão.
Além disso, há interessantes nuances para se pensar as possíveis diferenças entre tornar-se avô e tornar-se avó. Para as mulheres que gestaram seus filhos e filhas, situar-se como avós pode significar refazer esta passagem do tornar-se mãe. Destas, é provável que haja uma particularidade na transmissão da maternidade para as filhas das netas destas avós, compondo uma linha que atravessa as gerações de mulheres. Poucos anos atrás uma amiga muito próxima contou-me emocionada que sua filha estava grávida. Uma mistura de sentimentos a invadia e ela ansiava por uma conversa longa na expectativa de que alguma organização deste tumulto pudesse acalma-la. Aceitei o desafio, antecipando certo prazer nesta troca que, a meu ver, poderia se tornar fecunda para ambas. Estava longe de imaginar como a gestação de sua condição de avó seria construída passo a passo com idas e vindas em um misto de aflição e prazer, mas principalmente em um reviver nada tranquilo de sua própria gravidez. Muitas estórias depois, entre tormentos e êxtases, começou a despontar o espaço novo em que a futura neta iria habitar. Que avó ela queria ser para aquela menininha? Que valores ou afetos ela haveria de privilegiar na tarefa de transmissão a que ela estava se propondo? Mais uma rodada de lembranças foi acionada na tentativa de situar sua mãe, já falecida, naquela condição de avó. Alguém que felizmente havia estado muito presente e teria contribuído bastante para que os primeiros cuidados com sua bebê - que agora gestava sua netinha - pudessem parecer-lhe menos assustadores. Foram nove meses intensos em que pude compartilhar com ela uma mudança de peso em sua vida, primeiro na passagem do tumulto psíquico em que mergulhou para situar sua maternidade, depois no cuidado com que planejou a gestão de seu tempo para abrir espaços em sua rotina que seriam preenchidos pelo convívio com a netinha. O zelo e a responsabilidade com que ela tratara seu novo status me tocaram. Sem se questionar, ela havia trabalhado de forma incansável na construção deste novo espaço de avó.
Por outro lado, o exercício da voternidade é diferente do da maternidade, e isso precisa estar claro para ambas as partes. De qualquer forma o anúncio da chegada de um novo bebê exige sempre mudanças nos lugares já estabelecidos e, portanto, mais confortáveis de filha, filho, mãe, pai, etc. Mesmo com um esclarecimento maior sobre o papel dos atores desta empreitada ninguém está isento de aflições e medos diante de situações que revelam a complexidade das relações familiares. Ao lado de pais que encaram o projeto de gestar e criar um filho como uma tarefa das mais importantes e saem em busca de guias para construir seu novo lugar, há e não são poucos, os que se sentem incompetentes, desamparados, aflitos, e muitas vezes convocam seus pais para compartilhar e às vezes assumir as tarefas do cuidar. Mas a premissa óbvia de que caberia aos avós não confundir o seu lugar de pais de seus filhos, atropelando-os ou negando a escala geracional, deixa de fora os bastidores da dinâmica da circulação dos afetos em cada grupo familiar, que jamais estão isentos de sentimentos de ódio, inveja, rivalidade, ciúmes, exclusão, ressentimento, etc. São mães e pais que podem não suportar o crescimento de seus filhos e filhas ou que competem com estes, filhas que protagonizam gravidezes transgressivas, sintomáticas, etc.
E quanto aos avôs?  No capítulo dedicado a eles do Livro dos avós, Posternak (2010) publica uma cartinha que escreveu à sua primeira neta por ocasião de seu nascimento. Sem saber ao certo o que viria a partir dali, descreve a emoção de ser alçado a esta função pela própria neta, que só com o seu nascimento já o ajudara a construir um vínculo e que a partir do convívio, o faz transitar satisfeito entre o palhaço, o filósofo e o super-homem.  Convida aos homens que se tornam avôs, a revisitar sua própria paternidade e o vínculo com seu pai e se possível, promover o enterro das idealizações em torno deles. Também acredita que os papeis associados a cada gênero, ainda vigentes na cultura atual, dificulta à sua geração de avôs a exercerem uma função materna e paterna com a mesma facilidade com que as avós, mas aposta que as próximas gerações poderão usufruir de forma diferenciada deste convívio.
De qualquer forma, na organização social atual, além dos que assumem diretamente as funções de cuidados, os avós têm sido convocados, junto a outros atores, a exercer uma das funções mais importantes na tarefa de cuidar de quem nasce. São agentes promotores de alteridade que ajudam a propiciar o movimento psíquico, presente em toda cultura, que insere a criança na ordem simbólica própria ao humano para que ela possa se socializar.
Para terminar
Habitamos um mundo em que não é mais necessário ter filhos e, ainda que os humanos continuem a valorizar as formas de transcender, sendo uma  delas a busca de perpetuação via o nascimento de filhos, muitos optam por não serem pais. Na fórmula atual dos que encaram tal projeto não há como escapar do túnel construído pelos saberes biomédicos que envolvem os cuidadores visando a “saúde” dos bebês e da educação, na formação dos futuros cidadãos do mundo. Mas ser um “bom” cuidador não está contido em algum modelo bem acabado, ao contrário, os milhares de informações dos diferentes saberes mais embaralham do que auxiliam. Além disso, a gestação e nascimento de um bebê nem sempre são parte de um projeto que contenha o desejo de ter filhos. As razões podem ser equívocas ou contingenciais, o que abriria um vasto campo para se pensar o lado sombrio da infância, excluído do cuidado construído pela cultura, e o estado de vulnerabilidade, miséria e exploração a que muitas crianças ficam submetidas.
Em seu livro Cuidado, saúde e cultura, Figueiredo (2014) analisa, à luz da psicanálise, as íntimas relações entre os processos de saúde (física e psíquica) e os processos e objetos da cultura para pensar as práticas de cuidado - tema que vem abordando desde seu livro anterior - As diversas faces do cuidar (2009) – que atravessam e costuram saúde e cultura. A ética do cuidado seria esta dimensão da disposição do mundo humano em receber seus novos membros a fim de propiciar uma possibilidade de “fazer sentido” de suas vidas e constituir uma experiência integrada, algo que não seria possível caso esta experiência não pudesse ser exercida, transmitida e facilitada por aqueles que cuidam. É assim que, tal como uma roda viva, cada sujeito que é recebido na vida, no mundo e na história humana, deve ele mesmo se tornar um participante ativo desses processos do cuidar, algo a ser transmitido pelo cuidado que lhe foi oferecido, ressaltando-se ainda a importância dos efeitos de transformação a que ambos ficam sujeitos. Mas o que define um bom cuidador ou um bom receptor de cuidados? O que diferencia um sujeito para que ele se torne mais ou menos apto a exercer as funções cuidadoras?  Tomando como premissa que uma das metas dos cuidados é a de levar aquele que está sendo cuidado a desenvolver as capacidades criadoras, a partir de consistentes referências psicanalíticas muitas delas contemporâneas, Figueiredo faz uma tentativa de validar, das infinitas maneiras de nos subjetivar, aquelas que seriam as ideais para um sujeito vir a ser um bom cuidador ou exercer o seu cuidar como algo prazeroso e lúdico. Através de uma psicopatologia das funções cuidadoras, vai nomeando os acertos e desvios, algo como um modelo mais ou menos calcado em um desenvolvimento psíquico saudável, longe de fanáticos, obsessivos, apáticos ou sádicos, em um equilíbrio dinâmico entre as funções de presença implicada e presença reservada. Seus textos parecem querer encontrar respostas a algumas perguntas importantes de nossa era: quem cuidará de nossos bebês, futuros cidadãos deste mundo? Como deverão ser estes cuidados? Que contribuições a psicanálise, como um dos agentes cuidadores, pode dar? 
Já para Calligaris (2013), os cuidadores de nosso mundo atual, ao tentar exercer o papel de adultos encarregados de transmitir os valores necessários à convivência humana não percebem que estão imersos em uma infantolatria, a paixão narcísica que os faz venerar suas crianças e jovens. A partir desta premissa muitas questões podem ser colocadas: Será que seríamos capazes de um amor não narcisista pelas nossas crianças? De desejar produzir vidas por uma razão que não fosse a de reproduzir a nós mesmos? Quem, nos tempos contemporâneos de “eus” narcísicos e frágeis, se disporia a regular o seu prazer em prol de uma consciência da dívida, do dever com as gerações passadas, futuras ou com o outro? Por quais caminhos e conflitos o jogo narcísico que nos constitui e nos reúne pode vir a dar alguma forma ética às nossas condutas?
Em sua tentativa de analisar quais as chances do sujeito do século XXI fazer valer a civilização sobre a barbárie, Enriquez (2006) conclui que apesar do homem atual ter conquistado certa autonomia e de não ter mais necessidade de grandes transcendentes para conduzir a sua própria vida, estaria submetido ao reino do dinheiro - um fetiche sagrado, ao do poder do Estado e a possibilidade de um “retorno” identitário ao grupo a que pertence e à crença nos seus fundamentos. Para ele, a racionalidade instrumental e as estratégias financeiras acabam por utilizar o sujeito, que acredita ser em grande parte autônomo, para superexplorá-lo e aliená-lo. Tal lógica cria uma elite financeira que, por seu lado transita no topo e no gosto pelo poder, tornando-se perversos ou paranoicos e, por decorrência, hostis aos desviantes e não conformes, contribuindo para o crescimento do desprezo, da generalização da desconsideração, do desrespeito, da recusa da diferença a que tem direito todo ser humano. Todos são convidados a se tornarem meros consumidores ou “mercenários”, os políticos parecem cada vez menos críveis, muitos se deixando corromper. É assim que muitos indivíduos se voltam à sua própria identidade, para cuidar apenas de “si”, de sua vida privada, de seus investimentos cotidianos, de sua família, como se não houvesse motivos para participar do trabalho de civilização. Os outros podem ser apenas objetos de prazer, de vantagens ou de obstáculos. Mas, se se reconhecer como sujeito é essencial, perceber-se como apenas um indivíduo indiferente aos outros e ocupado apenas com suas próprias preocupações pode ser mortífero. Diante deste cenário desolador Enriquez chama a atenção para uma nova ética, da discussão, em que todos podem ter acesso ao máximo possível de informações, a partir das quais identificariam os problemas mais importantes com os quais se confrontam, para se interrogar e constituir um fórum de debates no espaço público. Embora o texto não cite, talvez por ter sido escrito em 2006, este lugar de trocas seria uma das possibilidades trazidas pelas redes sociais. Os movimentos sociais produzidos seriam de outra ordem, não tão ruidosos e apostam no acesso democrático e igualitário para interrogar valores éticos e estéticos vigentes e propor mudanças nas normas e hábitos que prescreveram ou são ilegítimos. O texto termina afirmando que não há sociedades felizes nem futuro radioso. Aqueles que acreditaram nisso destruíram os homens e as sociedades em que viveram. E, no entanto, nem por isso é preciso renunciar à visão de sociedades mais justas, menos alienantes, nas quais os homens seriam mais inclinados à sublimação que à idealização ou ao recolhimento em si mesmos.
Diante do universo complexo e rico que é o do cuidado com o bebê, em que há os que o recebem, que podem se deixam afetar ou ser convocados a se implicar neste encontro e os que vivem essa experiência como ameaçadora e angustiante, se a qualidade dos cuidados parentais recebidos por crianças nos primórdios de sua vida é de vital importância para sua saúde física e mental, não se pode desconsiderar o potencial criativo e a capacidade das crianças na procura de vínculos alternativos que possam lhes fornecer experiências de acolhimento e intimidade. Podem ser avós, tios ou pessoas significativas que possam dar um sentido a essa experiência, permitindo que o afeto circule em palavras e não fique petrificado em ato ou em repetição.
Em tempos de crise e de falta de perspectivas para o convívio humano, convém ficar atento às novas propostas de se viver a vida e às possibilidades de se incluir um novo ser na coletividade humana.

Referências bibliográficas 
                                                                                              
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Gisela Haddad é psicanalista, mestre em Psicologia Clínica e membro do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae. É autora do livro Amor e Fidelidade (Coleção Psicanalítica, Casa do Psicólogo - 2009)  e Amor (Coleção Emoções, Editora Duetto – 2010).

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