Dos cuidados com o bebê:
quem se responsabilizará?
Gisela
Haddad *
Já vou,
será/eu quero ver/o mundo eu sei/não é esse lá/por onde andar/eu começo por
onde a estrada vai/e não culpo a cidade, o pai/vou lá, andar e o que eu vou
ver/eu sei lá (Primeiro Andar – Los Hermanos)
Esse mundo
Há apenas
algumas décadas, as mudanças em valores sociopolíticos, culturais e morais que
organizavam a sociedade cumpriam um prazo que permitiam às novas gerações
assimila-los contrastando-os com aqueles transmitidos pelas gerações
anteriores. O que se convencionou chamar de pós-modernidade, ao contrário,
caracteriza-se não só por uma desconstrução às vezes radical de antigas crenças
e modos de existência, mas por uma velocidade jamais vista. Tal
panorama inusitado e muito mais complexo tem instado pensadores de áreas
diversas a tentar capturar o "zeitgeist" ou espírito da época,
buscando elementos que contextualizem e articulem estas transformações com as
aspirações e as angústias próprias deste momento. Freud afirmava que produzimos
cultura na esperança de nos proteger dos perigos reais e imaginários, mas
sempre permanece um resto que marca o limite da criação humana em sua tentativa
de suprimir o mal-estar inerente ao humano. Há, portanto um movimento
civilizatório incessante de produção de normas e compensações com a finalidade
de conciliar o sujeito com a cultura e se o sofrimento toma as feições de cada
época, é provável que na atualidade se articule às mudanças na vivência do
tempo, às projeções do futuro, na percepção e na relação com o corpo, na relação
com os outros sujeitos em que importam atributos como performance pessoal e
aparência física, nos modos como se vive a interioridade, que adquire cada vez
mais realidade psíquica no que é exterior.
Torna-se
difícil às vezes avaliar de forma mais consistente o que significa viver em um
mundo que nos oferece tantas facilidades tecnológicas, acesso imediato a
quaisquer informações, inúmeras maneiras de cuidarmos de nossa saúde, mais
tempo para inventarmos formas de lazer, liberdade para escolhermos pares, amigos,
carreiras, estilos e vida sexual. São novas maneiras de se viver e ser
reconhecido como membro da irmandade humana. Se de um lado o deslocamento da
ética repressiva à ética do direito ao gozo e à felicidade incita a abolição do
sofrimento, a recusa de qualquer signo da falta, do negativo e da
imprevisibilidade e oferece a certeza do conhecimento científico, a
possibilidade de gestão das competências e habilidades pessoais e a eliminação
de transtornos ou a correção de comportamentos desviantes como acessíveis a
todos, o que nos parece que permanece velado é que esta dinâmica pressupõe
necessariamente a criação de uma abertura para o novo e o incerto, não sem
custos como se propaga.
A própria
noção do que é humano, que antes nos representava pela diferença da noção de
animal, encontra-se em mutação, e se transforma pelas tecnologias, pelas
guerras, pelas mudanças climáticas, obrigando-nos a incluir em nossa condição
humana nossa dependência das biotecnociencias. A noção de risco invade nosso
cotidiano e impõe vigilância, controle e reparação permanentes em
todos os aspectos de nossas vidas seja nas formas de prazer ou nas experiências
de mal-estar. É assim que, por traz da esperada autonomia do sujeito que muitas
vezes é celebrada como conquista, percebe-se uma crescente dependência de
discursos competentes cuja proliferação acaba por produzir menos um acúmulo de
certezas do que uma angustiante e interminável errância.
Este
texto pretende fazer um recorte deste gap entre as demandas de um ideal cultural
prometeico e o vazio de referencias que pudessem se legitimar pelo social
problematizando as funções daqueles que cuidam dos que nascem no cenário da
família contemporânea, este grupo social especial que tem como principal
objetivo acolher, cuidar e preparar os futuros cidadãos e oferecer meios para
que se integrem na e construam seus destinos como parte de uma coletividade
maior.
Famílias e o futuro
Se formos
escolher, dentre as inúmeras mudanças que nossa época apresenta em relação à
anterior é quase impossível escapar de um dos conceitos pilares da teoria
psicanalítica, a família. Também é fato que as transformações da família, que
não foram poucas, estão em parte articuladas à metamorfose ocorrida nos ideais
daquela época, no permitido e proibido, normal e desviante, que ordenavam a
sociedade de então, e que resultou na desconstrução de um modelo familiar
hierárquico e rígido. O naufrágio deste modelo da família nuclear impõe-nos uma
análise que não pode ser simples sobre as consequências de suas inúmeras e
importantes alterações. Destas destacamos as conjugalidades que, ao contrário
da estabilidade formalizada à priori nos antigos casamentos, baseia-se hoje em
pactos entre os cônjuges que dependem exclusivamente da lealdade e do
comprometimento mútuo, o que permite ou não compartilharem uma busca de metas
em longo prazo que implique um adiamento de satisfações em troca de um futuro.
Uma destas metas seria o projeto de criação de um filho, mas ser pai ou mãe, ou
exercer uma função de parentalidade está hoje baseado principalmente em um
comprometimento.
A
"função paterna" ou "materna" tão caras à psicanálise são
funções de cuidados e responsabilidade com o desenvolvimento físico e psíquico
do bebê e com sua inserção na cultura e, apesar das mudanças ou por causa
delas, vem ganhando espaço e atenção, inclusive entre os psicanalistas,
mantendo-se como foco constante de produção de saberes múltiplos que se dirigem
ao acolhimento das necessidades do bebê e de seu futuro. Mas como saber ao
certo qual a contribuição dessas diversas práticas de saúde, educação e
cuidados produzidas em nossas sociedades? Afinal o que se espera de um
acolhimento ao infans? Ao colocar a criança e a infância no centro das
preocupações presentes e futuras, modelos normatizados e idealizados destas
funções são criados, na expectativa de que estes pais ou cuidadores possam vir
a serem eles mesmos, especialistas. Paradoxalmente o discurso prometeico da
ciência muitas vezes os destitui de seu saber, e acomodando-os a um
apassivamento. Instala-se um ethos terapêutico para a família e uma
disciplinarização das funções do grupo familiar: engravidar ou não, como e
quando engravidar, o que fazer quando não se consegue engravidar, como ser pai,
como ser mãe. Em poucas décadas, foram construídas uma infinidade de
informações, cartilhas e serviços e profissionais cada vez mais especializados
na gestação, partos e primeiros cuidados. Com o advento das redes sociais
proliferam blogs com depoimentos e testemunhos de futuros ou atuais mães e pais
com dicas que vão desde a infinidade de objetos considerados imprescindíveis à
tarefa dos primeiros cuidados, como temas mais viscerais como o sono do bebe, o
choro, a amamentação, o uso da chupeta, o banho, as dores de barriga, onde
dormir, como e quando toma-lo no colo, na expectativa de responder às angustias
e incertezas que assombram aqueles que inauguram sua função de pais. Claro que
muitos se beneficiam deste aparato, embora a profusão de informações e
recomendações coloque-os frente a difícil tarefa de separar o joio do trigo, e
acaba por impedir que muitos tentem buscar o que lhes pareça se encaixar melhor
em seu modo de viver a vida. Acresce-se a isso o fato de que invariavelmente o
bebê real desconstrói o modelo ideal que se tentou montar. Não há como evitar a
surpresa, a estranheza e o enigmático que ronda esta passagem de um ser que
demanda cuidados de todas as ordens e que precisará, graças a estes cuidados,
ser adotado pelos pais e pela cultura. É inegável que no mundo contemporâneo há
mais pais amorosos e preocupados em proporcionar um ambiente protegido aos seus
filhos, mas muitos não sabem como fazê-lo e se sentem desamparados ao se
deparar com a tarefa de construir cada um ao seu modo e possibilidades, sua
função parental. Sabemos que a proposta de se manter o amor como base na tarefa
de acolher, criar e educar as crianças, não garante a paz e a harmonia no
interior de um grupo familiar. A dinâmica entre os membros de uma família é
complexa e depende de uma rede de sentimentos e fantasias que se cruzam. Os
excessos são em geral patológicos, as justas medidas difíceis e a tarefa de
construir um espaço que possa suportar os conflitos entre as expectativas e os
fracassos, os sentimentos de amor e ódio, de acolhimento e autonomia, são
infinitas. Também é fato que no mundo atual a criança se tornou fruto de um
alto investimento dos pais, e passa a carregar descabidas e por vezes
equivocadas expectativas por parte destes. Esta via dupla da dívida amorosa
pode se converter em sentimentos de culpa e vergonha pela incapacidade de
cumprir o que se espera de um e outro ou pela sensação de não se amar ou não
ser amado tanto quanto se queria. Embutido neste mal-estar está a promessa de
felicidade que toda criança carrega em parte como possibilidade de realizar o que
os que cuidam não puderam, o que aumenta a tensão entre o normal e o
“desviante” definidos pela cultura e produz o insuficiente, o atrapalhado, o
mal sucedido, categorizados como fracassados por si e pelos demais.
O
nascimento de um novo bebê, além de um fato físico, social e político, é também
um fato psíquico que pressupõe que alguém lhe antecipou um lugar e que será
investido para que possa ser reconhecido como parte de uma organização social
ao receber as heranças da cultura a fim de se tornar um sujeito. Tanto o fato
físico quanto o social são meros acordos, não pressupõe que os pais sejam
biológicos e sim que reconheçam a criança como filho e se encarreguem de seus
cuidados. Ao perder sua importância social na constituição da parentalidade, a
consanguinidade vem dando lugar a um critério considerado crucial pela
psicanálise: todas as crianças ao nascer precisam ser adotadas por seus
cuidadores, sejam elas ou não filhas biológicas. E este “adotar” é um processo
quase sem fim. O bebê humano depende deste investimento e comprometimento para
sobreviver física e psiquicamente e para que lhe seja transmitido o patrimônio
cultural simbólico. A transmissão simbólica tem garantido aos novos seres um
lugar na cultura para que possam ser inseridos e reconhecidos e que permita a
estes construir novos discursos para estas mesmas funções parentais com novas
referencias simbólicas. Se não se pode deixar de destacar a importância das
referencias simbólicas há que se lembrar contudo, que não existem definições
únicas ou normativas para o acesso a ordem simbólica ou para as relações entre
os humanos : não há um modo único de subjetivação. As peculiaridades das
organizações subjetivas de cada época apontam constantemente para novas formas
de constituição subjetiva. Em uma cultura em que o indivíduo tem mais valor do
que a comunidade os laços muitas vezes visam menos as alianças e tradições do
que a satisfação pessoal, assim como as identidades podem ser negociadas e
apoiadas prioritariamente no real dos atos, como o corpo, a etnia, a
indumentária, a preferência sexual, e menos na cadeia das filiações simbólicas
e geracionais.
De um
modo geral o desenvolvimento psíquico está articulado a um processo de
subjetivação que se dá no e pelo espaço constituído com um outro significativo,
e em contínua apropriação reflexiva de experiências que promovem a
simbolização. As falhas deste processo e as defesas contra estas falhas
(psicopatologias) que em geral acontecem nos primeiros dois anos e comprometem
o processo de simbolização, dificultam a apropriação subjetiva da própria vida.
Por estas razões a clínica psicanalítica tem se debruçado mais sobre os dois
primeiros anos de vida, o que traz para a cena principal a questão da presença,
da ausência e da influencia de um sujeito sobre outro (a identificação), as
angústias de intrusão ou de abandono e cuidadores que não puderam ou não
conseguiram exercer seu papel de refletir ao bebê quem é ele ou servirem-lhe de
intérpretes do mundo. Espera-se que os cuidadores possam assumir as
funções de sustentar, conter, reconhecer, espelhar, interpelar e convocar para
que a criança possa construir uma referencia para si mesma, tornando-se ela
mesma capaz de vivenciar e dar nome as suas próprias emoções. No atual espaço
clínico da psicanálise da infância, os cuidadores passam a ser benvindos,
convidados a participar e quiçá auxiliados a se autorizar ao exercício de suas
funções parentais com suas dificuldades e incertezas. Uma tarefa de cuidados
importante, pois se há uma certeza é a de que tornar-se um cuidador (pai ou
mãe) é uma passagem complexa e difícil para todos que a enfrentam.
Passemos
ao fato politico do nascimento de um bebê, que na convergência entre o fato
psíquico e o social, revela a dimensão politica do cuidado e abre uma reflexão
sobre a relação de cada sujeito com a sociedade.
Tornar-se humanos e cidadãos
Em seu
recente livro “Cuidado, saúde e cultura” Luís Claudio Figueiredo analisa, à luz
da psicanálise, as íntimas relações entre os processos de saúde (física e
psíquica) e os processos e objetos da cultura. Para ele as práticas de cuidado
- tema que vem abordando desde seu livro anterior “As diversas faces do cuidar”
- atravessam e costuram saúde e cultura. A saúde aqui tomada no sentido amplo é
pensada como a possibilidade de sustentar as capacidades vitais em sua máxima
potência, como um aparelho para cuidar, deixar-se cuidar e ser cuidado seja em
uma dimensão interpessoal, pessoal ou cultural. O tema do cuidado é
problematizado e analisado de forma minuciosa e rigorosa tanto para os que
exigem cuidados de diferentes agentes como é o caso dos bebês e seus
cuidadores, como os inúmeros agentes cuidadores, entre eles os psicanalistas em
suas complexas e delicadas formas de cuidar. A ética do cuidado seria esta
dimensão da disposição do mundo humano em receber seus novos membros a fim de
propiciar uma possibilidade de “fazer sentido” de suas vidas e constituir uma
experiência integrada, algo que não seria possível caso esta experiência não
pudesse ser exercida, transmitida e facilitada por aqueles que cuidam. É assim
que, tal como uma roda viva, cada sujeito que é recebido na vida, no mundo e na
história humana, deve ele mesmo se tornar um participante ativo desses
processos do cuidar, algo a ser transmitido pelo cuidado que lhe foi oferecido,
ressaltando-se ainda a importância dos efeitos de transformação a que ambos
ficam sujeitos. Mas o que define um bom cuidador ou um bom receptor de
cuidados? O que diferencia um sujeito para que ele se torne mais ou menos apto
a exercer as funções cuidadoras?
Tomando
como premissa que uma das metas dos cuidados é a de levar aquele que está sendo
cuidado a desenvolver as capacidades criadoras, a partir de consistentes
referências psicanalíticas muitas delas contemporâneas, Figueiredo faz uma
tentativa de validar das infinitas maneiras de nos subjetivar, aquelas que
seriam as ideais para um sujeito vir a ser um bom cuidador ou exercer o seu
cuidar como algo prazeroso e lúdico. Através de uma psicopatologia das funções
cuidadoras, vai nomeando os acertos e desvios, algo como um modelo mais ou
menos calcado em um desenvolvimento psíquico saudável, longe de fanáticos,
obsessivos, apáticos ou sádicos, em um equilíbrio dinâmico entre as funções de
presença implicada e presença reservada. Seus textos parecem querer encontrar
respostas a algumas perguntas importantes de nossa era: quem cuidará de nossos
bebês, futuros cidadãos deste mundo? Como deverão ser estes cuidados? Que
contribuições a psicanálise, como um dos agentes cuidadores, pode
dar? Não são poucas as articulações que os textos trazem entre as
práticas de cuidado e um rigoroso mapeamento da atividade psíquica, seu
funcionamento e desenvolvimento, a clínica psicanalítica e o trabalho do
analista, etc. Cumpre com maestria a ideia de uma teoria geral de cuidados.
No final
do capítulo sobre a metapsicologia do cuidado, no entanto, Figueiredo descreve
uma cena interessante, possivelmente algo que experenciou e que de certa forma
problematiza os limites de um modelo de cuidados e cuidadores. Em uma visita a
um familiar internado em um hospital com recursos tecnológicos de primeira
linha, em que é possível se maravilhar com a assepsia ou com o nível técnico de
seus atendentes, parece não haver cuidadores. Não há ali alguém preparado para
atender as pequenas demandas dos pacientes, suas inquietações, seus medos, suas
manias. Tornou-se comum a própria família se encarregar de levar seu cuidador
para exercer tais funções. Ali o cuidado ficou sem um lugar, quase invisível. É
neste contexto que Figueiredo resgata o performático trabalho dos Doutores da
Alegria, incansável em sua afirmação da importância do cuidado, oferecido em
doses de alegria e humor. Eles seriam objetos transformadores na medida em que
tentam dar visibilidade para o que as normas hegemônicas da cultura tornam
invisíveis.
Em
entrevista a última publicação da Revista Percurso de Psicanálise, Benilton
Bezerra Jr., seguindo a obra de Georges Canguilhem afirma que para compreender
a diferença entre normalidade, anomalia (atipia) e anormalidade (
patologia) e o conceito de saúde, é necessário o conceito de normatividade pois
de outra forma ficamos presos ao que nos diferentes contextos históricos, são
acordos que delimitam a fronteira entre patologia e normalidade. A
normatividade seria a capacidade permanente em um ser vivo de se auto
preservar, reproduzir e criar novas formas para si, e nos humanos também de
modificar o ambiente e as formas de vida coletiva. Se a prática psicanalítica
se sustenta por um lado na aposta de que a normatividade é inerente à condição
humana, alimenta-se do fato de que a errância humana sempre pode surpreender e
subverter a lógica normativa. Se a cultura atual pode aceitar a premissa de que
a normalidade é apenas uma convenção transitória, muito se deve a luta de
certos grupos que vem reinventando seu modo de presença social, dentre eles os
deficientes, autistas, transsexuais.
Esta tem
sido o que a filósofa Judith Butler chama de sua militância. Em sua recente
passagem pelo Brasil, ela que de forma consistente e corajosa problematizou o
tema da identidade de gênero questionando o binarismo masculino/feminino e o
lugar de abjeto daqueles que não se enquadram nestas categorias, falou sobre
seu mais recente livro “Quadros de guerra - quando a vida é passível de luto”,
em que amplia sua pesquisa para a precariedade e as mobilizações globais contra
as desigualdades econômicas, sociais e políticas, que produzem cada vez mais
populações “designadas como dispensáveis e indignas de luto”. Segundo ela a
cultura, em todas as formas de discurso, jurídico, científico ou meios de
comunicação, contribui para a produção do “abjeto” e tal diferenciação precisa
ser analisada e desmontada para que a liberdade de existir como se é possa
entrar em cena. Butler chama de “performatividade” o caráter ativo da relação
entre o sujeito e a sociedade, ou para o fato de que as palavras provocam ações
e atuações. Ou seja, é preciso fazer uma leitura minuciosa e constante e ficar
atento às pautas hegemônicas de valores que cada cultura elege e o que fica na
invisibilidade. Butler convida-nos a apostar em nossa capacidade de intervir na
ordem vital e reinventar um modo de presença social com base em uma assunção
mais decidida de uma posição subjetiva resistente a normas impostas pela
cultura.
Se há um
movimento civilizatório incessante de produção de normas e compensações com a
finalidade de conciliar o sujeito com a cultura, se estes assumem
novas feições a cada época, talvez o resto que demarca o limite na tentativa de
suprimir o mal-estar inerente ao humano seja sempre o custo desta conciliação.
As formas de cuidar deveriam levar em conta a dificuldade em refletir sobre o
que significa conviver com a consciência da contingência como ônus da
liberdade, espaço indispensável para estar apto às "possibilidades
indeterminadas" de um futuro que exige um movimento permanente de criação
de um destino. Esta seria a dimensão politica por excelência, a qual todos os
agentes cuidadores da cultura deveriam incluir em seus horizontes. Até a “velha
e boa psicanálise” (expressão utilizada por uma jovem paciente quando decidiu
se submeter a uma terapia psicanalítica).
Na ordem
do dia e na escala da performatividade, talvez possamos incluir um projeto que
vem se difundindo pelo mundo entre alguns jovens e que atende pelo sugestivo
nome de laboratórios cidadãos. Seriam espaços em que pessoas com
diferentes conhecimentos e diferentes graus de especialização se reúnem para
desenvolver projetos ligados a exploração de formas de experimentação e de
aprendizagem colaborativa, prática que surgiu a partir das redes digitais para
promover processos de inovação cidadã. Qual? Os espaços são abertos à
participação de qualquer cidadão e os projetos trabalhados e criados nestes
laboratórios buscam uma transformação social que contribua para o desenvolvimento
cultural, social e econômico do país.
Querem
outro exemplo? As pequenas mãozinhas brincam com as mãos marcadas pelo tempo e
de movimentos lentos em Seattle, nos Estados Unidos. As brincadeiras e as
atividades poderiam confundir o visitante desavisado. Trata-se de uma casa de
repouso para idosos ou uma pré-escola? O Intergenerational Learning Center
juntou as duas coisas. O local abriga crianças de até cinco anos que realizam
atividades cotidianamente com os mais de 400 idosos atendidos no espaço. De um
lado, as crianças aprendem a se relacionar com diferentes gerações, a respeitar
os mais velhos e a conviver com pessoas com limitações físicas. Já os idosos
recebem carinho e são estimulados intelectual e fisicamente pelos exercícios
com os alunos.
A se
pensar, e criar.
Gisela Haddad é psicanalista, mestre em Psicologia Clínica e membro do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae. É autora do livro Amor e Fidelidade (Coleção Psicanalítica, Casa do Psicólogo - 2009) e Amor (Coleção Emoções, Editora Duetto – 2010).
Gisela Haddad é psicanalista, mestre em Psicologia Clínica e membro do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae. É autora do livro Amor e Fidelidade (Coleção Psicanalítica, Casa do Psicólogo - 2009) e Amor (Coleção Emoções, Editora Duetto – 2010).
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