quarta-feira, 24 de junho de 2009

fake.com

A história desta nova relação humana que a internet proporciona rendeu inúmeras questões. Uma delas chama a atenção por sua aparente estranheza: a nova mania entre os pré-adolescentes (em sua maioria) e entre alguns adolescentes, em manter identidades falsas nas redes de relacionamentos ( orkut, my space,facebook etc). A pergunta imediata seria questionar o sentido disto. Mas a resposta não é simples nem única. O surgimento das redes de relacionamento e a adesão maciça dos jovens a ela inaugurou uma nova e permanente maneira de se estar em um lugar virtual, através de um espaço que pertence só à aquela pessoa e que permite a ela se descrever como bem lhe apetecer, colocar suas fotos , de sua família, de seus amigos, paqueras,ídolos, deixar mensagens ou pensamentos e receber visitas e recados de qualquer um que pertença a rede. Mesmo que fique algum tempo sem abrir a sua página, esta funciona como se fosse uma casa permanentemente aberta à visitação de qualquer um que possa acessar a rede: os amigos poderão entrar e sair a vontade (também os desafetos), deixar seus scraps( recados), assim como a qualquer momento pode-se conferir quem esteve visitando e ler os recados deixados pelos visitantes. É possível decorar “sua casa” com pensamentos, poesias ou divulgando um pouco de si e de sua vida através de fotos geralmente renovadas para que todos possam se inteirar dos últimos eventos, festas, viagens que cada um fez. Ainda que esta “decoração” possa funcionar como uma forma de exibição ou provocação, também imprime uma marca e o conjunto da página passa a funcionar um pouco como um portal do que se quer que o outro saiba e conheça sobre nós. Mas sabemos o quanto manter uma “identidade” coesa, que afirme nossa auto-estima e que seja confirmada pelo reconhecimento de outros é talvez uma das tarefas mais importantes e mais difíceis e exaustivas pela qual nosso “euzinho’ deverá lutar a vida toda. As possibilidades de se travar novas amizades e de mantê-las que estas redes de relacionamento oferecem ao seu público consumidor não cessam de se renovar e a grande sacada de seus idealizadores é que os próprios usuários funcionam como termômetro para as novidades oferecidas: são eles quem mostram as falhas e propõem soluções ou novos caminhos. Isto aconteceu com os perfis “fakes” uma nova febre que se popularizou entre os pré-adolescentes, mas que só começou a acontecer quando foi instalado nas redes um dispositivo que permitia a cada um saber quem bisbilhotava o perfil alheio. A partir daí muitos passaram a criar identidades falsas para continuar espiando e como uma brincadeira, estes perfis fakes ganharam vida própria e passaram a habitar um mundo fake: sem esconder sua falsa identidade era possível ir a uma balada, uma praia,um shopping, namorar, casar e ter filhos, ou ainda assumir a identidade de algum ídolo: tudo fake. Um mundo “faz de conta”passou a poder ser inventado e cada um tinha a possibilidade de criar seu personagem ainda que fosse para poder falar de si e de seus desejos sem que isso o comprometesse. Embora tal brinquedo tecnológico seja novo, a brincadeira parece antiga.É bem provável que os pais dos pré-adolescentes atuais tenham brincado de “casinha” quando pequenos, um tipo de reprodução infantil do mundo adulto em que meninas ( em sua maioria) e meninos podiam “ser” algum adulto e encenar alguma de suas funções: pai, mãe, profissionais diversos, jogadores,etc.Também ali era possível adquirir uma identidade falsa, mudar de sexo, etc. Porém,ainda que se possa criar novas identidades ou se fazer passar por personagens que se conhece ou que sejam ídolos, o que representamos ou fazemos é da ordem do que desejamos ou dos conflitos que vivemos entre estes desejos e nossas inibições, obrigações, temores. A identidade fake dos adolescentes parece ficar a serviço da possibilidade de inventar novas histórias em que seja possível falar de coisas que causariam muita angústia e que ameaçariam uma imagem de si ainda precária. Coisas como perguntar o que não conseguem responder, cruzar algumas fronteiras que podem ameaçar o amor dos outros que lhe importam, enfrentar o medo de não serem tão amados quanto gostariam ou as dúvidas que os assolam quanto a sua identidade e que os divide entre momentos em que parecem ser especiais e outros em que precisam de uma urgente confirmação de sua existência.Ainda assim é bom que não nos esqueçamos que adolescentes ou adultos somos todos um pouco atores já que em geral passamos nossas vidas tentando corresponder à imagem que acreditamos ser aquela que mantêm nossa confiança de sermos amados.



coluna do dia 16 de junho de 2008

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