quinta-feira, 25 de junho de 2009

Segredos da China

Desde a semana passada, as imagens de uma imponente China invadiram as casas do mundo. Muralhas, rios, montanhas e verdes vales desfilam ao lado de projetos arquitetônicos de vanguarda, mega aeroportos, e uma nova e colorida população. Entre amostras de uma civilização que existe desde a Antiguidade e estádios esportivos que lembram um futuro espacial, o país parece ter escolhido as Olimpíadas para avisar a todos os outros, que “voltou” para ficar. Quanto a nós, do ocidente, acostumados que fomos a assistir à distância o regime fechado, azul e autoritário de várias décadas do comunismo chinês, estamos perplexos diante da rapidez com que o país adquire sua força econômica e se impõe ao mercado global. Em geral as críticas ao capitalismo liberal do ocidente apontam os efeitos concentradores e homogenizadores da globalização, que teria reduzido a intervenção de cada Estado diante de sua cada vez maior subordinação ao mercado econômico mundial. Já a China, ao contrário, não tem jogado o jogo da livre concorrência do modelo ocidental e sim imposto o ritmo de seus interesses para abrir sua economia e fazer seus investimentos. Ao quebrar esta regra hegemônica, ela desconcerta as previsões do mercado financeiro global. Embora a mídia, os intelectuais e economistas não se cansem de fazer previsões desanimadoras quanto à falta de programas sociais que legitimem os princípios de liberdade e respeito aos direitos humanos, o mais provável é que o fenômeno China abra espaço para novas e inusitadas questões sobre a análise da cultura atual e alguns prováveis destinos para a humanidade. Nas várias décadas em que a China esteve sob o regime maoísta seu povo nos parecia uma massa coletiva que aparentemente esmagava qualquer possibilidade de um eu individual. O Ocidente em sua maioria, se orgulha de perseguir os princípios do Iluminismo que privilegiam os direitos humanos universais e a democracia política, pressupondo a liberdade da subjetividade. Foram estes princípios que possibilitaram a consolidação de um individualismo social em que cada sujeito deveria se apropriar de sua própria história tomando nas mãos as decisões que afetam as condições de sua existência e politizando as várias esferas de seu cotidiano. Mas não podemos nos esquecer que o individualismo ocidental em sua articulação com os direitos humanos são, na verdade, históricos, assim como as subjetividades, ligados que estão ao contexto sociocultural. Também sabemos que o Ocidente em sua totalidade não manteve regimes democráticos o tempo todo, e mesmo nos regimes democráticos, a evolução dos direitos humanos não foi tranqüila e esteve sujeita a avanços e recuos, marchas e contramarchas, ações e reações, muitas vezes seguindo aspirações subjetivas de felicidade dos indivíduos. Quem sabe devêssemos pousar nossos olhares ocidentais e nossa pretensão de uma cultura universal, aos caminhos que os 7000 anos de civilização chinesa irão percorrer daqui para frente. Sabemos, por exemplo, de uma emergente classe média chinesa que desfruta hoje de uma economia familiar da ordem de 20 mil dólares, possui casa própria e filhos únicos que herdam o peso de apagar a pobreza e a falta de recursos vividas por seus pais.Sem tios, ou irmãos, estes novos chineses mergulham em cursos de inglês, esportes variados, música e teatro, ganham celulares, jogos e objetos de luxo, freqüentam restaurantes, fazem viagens, tudo dentro de uma tradição que combina esforço e disciplina, e de olho em um “upgrade” financeiro. Embora o deslocamento seja pequeno, é bom ressaltar que, ao contrário do boom do consumo no Ocidente, a conquista da felicidade destes novos chineses ainda não dispensa a labuta e o sacrifício.

Coluna do dia 12 de agosto de 2008

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